
Os seis longa-metragens da Mostra Competitiva tinham muitas questões em comum. A principal delas é que todas flertam com uma certa mistura entre documentário e ficção. Mesmo Sem Pena, que é o mais documental de todos, traz elementos da ficção, principalmente na montagem e escolha de símbolos para ilustrar o que os depoentes dizem. E um filme teoricamente totalmente ficcional como Ela Volta na Quinta, traz a família do diretor interpretando a si mesmo em um timming extremamente documental. Da mesma forma que Ventos de Agosto que coloca, inclusive, o diretor em cena como um "medidor de ventos", no momento mais documental da obra.

A decisão do Festival em não mais ter categorias tem muito a ver com isso. São todos filmes, em suas diversidades e suas misturas documentais e ficcionais. O que é extremamente interessante, mas também dificulta a distribuição e acesso do público. Dois dos seis filmes tiveram pessoas saindo no meio da sessão. O que não chega a significar algo ruim, é até uma provocação interessante, vide os filmes de Terrence Malick. Já Sem Pena foi ovacionado por um bom tempo e, não por acaso, ganhou o prêmio do júri popular mesmo competindo com um filme de Brasília.

Já entre os curta-metragens a variedade é maior, como pede o próprio formato do curta. E ao colocar documentários, filmes de gênero, experimentais e até uma animação no mesmo pacote fica mesmo mais complicado criar os critérios de avaliação. Ainda assim, há aqueles que se destacam.

O vencedor do júri oficial, Sem Coração, também é um filme sensível, com uma ótima construção de planos, e mesmo a fotografia mais granulada do 16mm traz um significado próprio para a história das crianças e suas descobertas de pré-adolescência. A junção de significados, os detalhes, a chuva, a fusão da piscina cheia com a lembrança da piscina vazia, a mão cerrada em um mistério instigante. Tudo nos toca.

Mas, na verdade, dentre os doze curta-metragens, o único que não me cativou foi mesmo o vencedor do júri popular. Crônica de uma Cidade Inventada tem boas intenções. E até momentos bons, mas, no geral, se torna um filme vazio ao falar de tudo e nada ao mesmo tempo. E não traz nenhum exercício de linguagem propriamente dito. Apenas um registro de uma cidade, no caso, Brasília.
No final, o Festival de Brasília demonstrou-se um excelente exercício de linguagens, experimentações e contatos diversos. Um Festival com carácter político forte, vide as manifestações da plateia a cada citação mais explícita e que de alguma forma dialoga com o cenário nacional como um todo. Torço para que todos tenham acesso às obras, principalmente aos longas que, dos seis, três já tem distribuição garantida. Sem Pena, inclusive, estreia na próxima semana.
Como tive a oportunidade de analisar todos os filmes da competitiva, até para ter argumentos na decisão do júri, fiz o meu ranking pessoal de preferência entre curtas e longas. Confira.
Ranking pessoal:
Longas:
Brasil S/A
Branco Sai. Preto Fica
Sem Pena
Ela Volta na Quinta
Ventos de Agosto
Pingo D´água
Curtas:
Vento Virado
La Llamada
Estátua!
Sem Coração
Luz
B-Flat
Bashar
Geru
Loja de Répteis
Castillo y el Armado
Nua Por Dentro do Couro
Crônicas de uma Cidade Inventada