Nas Profundezas do Mar Sem Fim
Baseado em livro de Jacquelyn Mitchard, Nas Profundezas do Mar Sem Fim é daqueles melodramas que cria empatia com todos por um simples detalhe: crianças desaparecidas sempre emocionam. A gente se envolve com o drama familiar, coloca-se no lugar e torce para que dê tudo certo, mesmo quando o destino prega uma peça. E o filme de Ulu Grosbard ainda tem um plus que não deixa de ser fundamental, a interpretação sensível de Michelle Pfeiffer.
Pat e Beth Cappadora são um casal como muitos outros nos Estados Unidos, país de três crianças, em uma relação estável, vêem suas vidas transformadas quando o filho do meio, Ben, desaparece sem deixar rastros. A busca incessante esfria, mas nunca deixa de existir, destruindo o casal aos poucos, além de sobrecarregar o filho mais velho, Vincent, que se torna uma sombra desesperada em busca de uma estabilidade familiar. Dez anos se passam e o inusitado acontece. Ao contrário do livro, o filme resume bastante a dor inicial para desenvolver melhor essa segunda parte, onde Ben agora é San, um garoto feliz que mora em Chicago e que sofrerá o baque de descobrir seu passado.
A construção inicial da dor da família pela perda do pequeno Ben é bastante sensível. Michelle Pfeiffer interpreta a depressão de Beth com delicadeza, alternando o estado de prostação com a agressividade e desespero. É interessante ver as imagens de contraste entre ela e o filho Vincent,uma criança de sete anos, que se vê acordando no meio da noite para dar mamadeira à pequena irmã, porque sua mãe é incapaz de levantar da cama, ou fazê-la gritar em uma tentativa desesperada de encerrar uma discussão agressiva entre os pais. Pat e Beth perdem Ben e não se dão conta de que junto, perdem também Vincent, sempre renegado na atenção da família pelo drama vivido. A cena em que espera sozinho do lado de fora a escola uma mãe que não vem buscá-lo simboliza bem isso.
A segunda parte oscila um pouco entre o banal e o sensível, mas traz um dilema emocional realmente maior. Como construir a felicidade em cima da dor daquele que devíamos amar incondicionalmente? Ben não existe mais, era uma criança de três anos que não se lembra da família original. Ele agora é San, um garoto que ama seu pai adotivo que não teve culpa de nada do que aconteceu. É um situação delicada, confusa até. A cena de San e Beth no cemitério da cidade é uma das mais sensíveis e simbólicas daquela situação. "Há coisas piores que a morte", diz o garoto em uma sabedoria invejável. De fato, morrer não parece mesmo o pior dos castigos para quem vê a sua vida desmoronar de uma maneira irreparável.
Mas, ao mesmo tempo que têm uma história sensível e interessante, o diretor Ulu Grosbard e o roteirista Stephen Schiff oscilam na construção da mesma. Passam rápido por alguns acontecimentos, não aprofundando os personagens e jogando na tela as situações em uma sucessão descuidada. A personagem de Whoopi Goldberg, por exemplo, fica completamente solta na história. Ela que deveria ser o porto seguro de Beth, um apoio, acaba sendo jogada em cenas pouco desenvolvidas, se tornando quase uma intrusa. Fora as frases que vão do nada a lugar nenhum como sua revelação na delegacia sobre sua situação de minoria.
Por outro lado a construção da relação dos dois irmãos é bem desenvolvida. Os pequenos atores conseguem transmitir bem a cumplicidade e rivalidade que existe entre eles. Desde a cena inicial com Vincent procurando Ben pela casa e o encontrando dentro do baú. Cena essa que será fundamental mais à frente na história. Outra cena de destaque é a primeira noite de San na casa da família Cappadora, quando Vincent dorme ao pé da cama do irmão, tendo o pequeno coelhinho ao seu lado. Grosbard mostra bem como o garoto sempre foi uma sombra do irmão em pequenas imagens, gestos, olhares.
Nas Profundezas do Mar Sem Fim é daqueles dramas familiares repletos de emoção. Um melodrama clássico, com interpretações sensíveis e alguns momentos memoráveis. Inconstante, porém funcional para aquilo que o filme se propõe.
Nas Profundezas do Mar Sem Fim (The Deep End of the Ocean: 1999 / EUA)
Direção: Ulu Grosbard
Roteiro: Stephen Schiff
Com: Michelle Pfeiffer, Treat Williams, Whoopi Goldberg, Jonathan Jackson.
Duração: 105 min.
Pat e Beth Cappadora são um casal como muitos outros nos Estados Unidos, país de três crianças, em uma relação estável, vêem suas vidas transformadas quando o filho do meio, Ben, desaparece sem deixar rastros. A busca incessante esfria, mas nunca deixa de existir, destruindo o casal aos poucos, além de sobrecarregar o filho mais velho, Vincent, que se torna uma sombra desesperada em busca de uma estabilidade familiar. Dez anos se passam e o inusitado acontece. Ao contrário do livro, o filme resume bastante a dor inicial para desenvolver melhor essa segunda parte, onde Ben agora é San, um garoto feliz que mora em Chicago e que sofrerá o baque de descobrir seu passado.
A construção inicial da dor da família pela perda do pequeno Ben é bastante sensível. Michelle Pfeiffer interpreta a depressão de Beth com delicadeza, alternando o estado de prostação com a agressividade e desespero. É interessante ver as imagens de contraste entre ela e o filho Vincent,uma criança de sete anos, que se vê acordando no meio da noite para dar mamadeira à pequena irmã, porque sua mãe é incapaz de levantar da cama, ou fazê-la gritar em uma tentativa desesperada de encerrar uma discussão agressiva entre os pais. Pat e Beth perdem Ben e não se dão conta de que junto, perdem também Vincent, sempre renegado na atenção da família pelo drama vivido. A cena em que espera sozinho do lado de fora a escola uma mãe que não vem buscá-lo simboliza bem isso.
A segunda parte oscila um pouco entre o banal e o sensível, mas traz um dilema emocional realmente maior. Como construir a felicidade em cima da dor daquele que devíamos amar incondicionalmente? Ben não existe mais, era uma criança de três anos que não se lembra da família original. Ele agora é San, um garoto que ama seu pai adotivo que não teve culpa de nada do que aconteceu. É um situação delicada, confusa até. A cena de San e Beth no cemitério da cidade é uma das mais sensíveis e simbólicas daquela situação. "Há coisas piores que a morte", diz o garoto em uma sabedoria invejável. De fato, morrer não parece mesmo o pior dos castigos para quem vê a sua vida desmoronar de uma maneira irreparável.
Mas, ao mesmo tempo que têm uma história sensível e interessante, o diretor Ulu Grosbard e o roteirista Stephen Schiff oscilam na construção da mesma. Passam rápido por alguns acontecimentos, não aprofundando os personagens e jogando na tela as situações em uma sucessão descuidada. A personagem de Whoopi Goldberg, por exemplo, fica completamente solta na história. Ela que deveria ser o porto seguro de Beth, um apoio, acaba sendo jogada em cenas pouco desenvolvidas, se tornando quase uma intrusa. Fora as frases que vão do nada a lugar nenhum como sua revelação na delegacia sobre sua situação de minoria.
Por outro lado a construção da relação dos dois irmãos é bem desenvolvida. Os pequenos atores conseguem transmitir bem a cumplicidade e rivalidade que existe entre eles. Desde a cena inicial com Vincent procurando Ben pela casa e o encontrando dentro do baú. Cena essa que será fundamental mais à frente na história. Outra cena de destaque é a primeira noite de San na casa da família Cappadora, quando Vincent dorme ao pé da cama do irmão, tendo o pequeno coelhinho ao seu lado. Grosbard mostra bem como o garoto sempre foi uma sombra do irmão em pequenas imagens, gestos, olhares.
Nas Profundezas do Mar Sem Fim é daqueles dramas familiares repletos de emoção. Um melodrama clássico, com interpretações sensíveis e alguns momentos memoráveis. Inconstante, porém funcional para aquilo que o filme se propõe.
Nas Profundezas do Mar Sem Fim (The Deep End of the Ocean: 1999 / EUA)
Direção: Ulu Grosbard
Roteiro: Stephen Schiff
Com: Michelle Pfeiffer, Treat Williams, Whoopi Goldberg, Jonathan Jackson.
Duração: 105 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Nas Profundezas do Mar Sem Fim
2011-10-30T10:45:00-02:00
Amanda Aouad
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