
Após esse início surreal, somos apresentados a Roberto, vivido pelo já conhecido Ricardo Darín, um homem solitário, mau humorado e cheio de manias como só desligar a luz às vinte e três horas em ponto. Um dia sua vida se cruza com a de Jun, um chinês perdido em Buenos Aires, sem falar uma palavra em espanhol. Duas pessoas completamente diferentes, com culturas opostas e sem falar a língua do outro vão ter que se entender e conviver por um período. Pelo menos até Jun encontrar sua família perdida naquele país estranho. E é dessa simplicidade, do cotidiano tão bem explorado por filmes argentinos e do choque cultural em convivência forçada já visto em tantos outros filmes que Um Conto Chinês tira uma mágica construção que nos envolve em cada detalhe.

Aliás, os detalhes são boa parte da riqueza de Um Conto Chinês. Desde o início com a passagem da cena na China para a cena em Buenos Aires começar de ponta cabeça e ir virando aos poucos, afinal a China fica do outro lado do mundo. São momentos de criatividade onde muita coisa é resolvida de maneira simples como quando Roberto aguarda para falar com um chinês importante e ouvimos músicas diferentes para indicar a passagem de tempo e demora da espera. Ou quando um pote de doce de leite sendo fechado simboliza toda a frustração e irritação por uma situação ruim. Ou as ações de Jun que está sempre trabalhando de maneira eficiente ou rabiscando em uma caixa de sapatos. Além, claro, do hobby de Roberto de recortar notícias bizarras no jornal.

Esta parte traz outro ponto rico para o filme que é a imaginação do protagonista visualizando a situação como se ele estivesse nela. Além do tom cômico do inusitado, é interessante perceber a mudança da estética da imagem, que se torna mais vibrante, com cores quentes, em um tom farsesco. A música também acompanha a construção do clima surreal, onde nada parece mesmo fazer sentido. São histórias completamente incríveis, porém retiradas de páginas de jornais. Tal qual a vaca da primeira cena. Daquelas histórias em que todos dizem que parece mentira, mas não é.

Um Conto Chinês é mais um daqueles filmes delicados e bem realizados dos nossos hermanos. Um filme simples, sobre o cotidiano, mas que toca o coração nos pequenos gestos. Não por acaso foi o maior sucesso do ano na Argentina atingindo um milhão de espectadores. Daqueles que nos deixam com vontade de ver outros tantos iguais.
Um conto chinês(Un Cuento Chino: 2011 / Argentina, Espanha)
Direção: Sebastián Borensztein
Roteiro: Sebastian Borensztein
Com: Ricardo Darín, Muriel Santa Ana, Ignacio Huang, Javier Pinto.
Duração: 93 min.