
No dia 25 de abril de 1991, o jornal Folha de São Paulo publicou uma carta aberta do seu diretor, Otávio Frias Filho, ao então presidente da república Fernando Collor de Mello. Este fato relaciona o jornalista ao protagonista de O Banquete, novo filme de Daniela Thomas. Tanto que, com o falecimento de Frias durante o período do Festival de Gramado, a obra foi retirada da competitiva a pedido da cineasta. E só por isso, fica parecendo que falta ao espectador comum uma informação extra, um código para compreender de fato o que é visto em tela, dando a sensação de algo direcionado a um grupo específico.
Na verdade, esquecendo essa citação à carta, O Banquete traz um retrato genérico da elite brasileira. Uma grande mesa que reúne a imprensa e a classe artística observadas pelo cidadão assalariado que está ali para servi-los. Há uma busca pela ironia crítica de Buñuel com O Anjo Exterminador, assim como uma certa relação cênica com Deus da Carnificina. Além, claro, da inspiração declarada a O Banquete, de Platão. Os gregos, inclusive, são evocados a todo momento, seja em filosofias, em citações ao amor ou mesmo em piadas jocosas de mal gosto sobre a sexualidade deles.

A carta ao presidente, a questão da corrupção e a frágil recente redemocratização do país não chegam a ser um pano de fundo verdadeiramente importante. Toda a construção cênica parece movida pela vingança de uma mulher contra um homem mulherengo. Uma noite regada a vinho e comidas afrodisíacas que vai desvelando máscaras e hipocrisias para expor o jogo amoral que envolve a elite brasileira. E não deixa de ser curioso como tudo começa com a desculpa de celebrar o amor, por isso, a evocação ao banquete de Platão. O fato de estarem todos ao redor da mesa de jantar também traz a relação óbvia com Panis Et Circensis.

Ainda que pareça existir uma intenção escusa na referência direta a pessoas e situações reais, O Banquete parece apenas partir disso para ficcionalizar uma sensação genérica sobre um grupo específico e todos os jogos que o envolvem. Ainda que não original, bebendo em diversas fontes filosóficas, literárias, teatrais e fílmicas, há de se reconhecer um mérito artístico na obra. Com boas atuações e uma direção bem planejada, o filme passa o seu recado. Ainda que a promessa de reflexão política se perca na sinopse e a própria reflexão filosófica sobre a natureza humana não passe do superficial.
O Banquete (O Banquete, Brasil, 2018)
Direção: Daniela Thomas
Roteiro: Daniela Thomas
Com: Drica Moraes, Rodrigo Bolzan, Caco Ciocler, Mariana Lima, Fabiana Gugli, Gustavo Machado, Chay Suede, Bruna Linzmeyer
Duração: 104 min.