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Desde os primeiros minutos, G20 (2025) tenta se afirmar como um thriller político de ação em escala global. O filme, dirigido por Patricia Riggen e estrelado por Viola Davis, começa com uma premissa potente: durante a cúpula do G20, na África do Sul, líderes mundiais são feitos reféns por um grupo de mercenários determinados a manipular mercados e democracias por meio de deepfakes e ataques cibernéticos. A ideia, em teoria, é explosiva e mistura atualidade geopolítica, tecnologia e espetáculo, mas na prática revela o abismo entre a ambição conceitual e a execução dramática. Riggen constrói uma fantasia de poder envolvente, mas que oscila entre a verossimilhança e o puro escapismo, sem encontrar um tom consistente.
Viola Davis, interpretando a presidente dos Estados Unidos, Danielle Sutton, é o coração e o motor do filme. Sua presença é magnética, firme, capaz de conferir credibilidade mesmo às situações mais improváveis. Davis interpreta Sutton como uma líder multifacetada, que combina o pragmatismo político de uma estadista com a força física de uma ex-militar treinada para sobreviver. Há nela algo de John McClane em Duro de Matar, mas com a densidade emocional que Davis costuma imprimir em todos os seus papéis. Sua atuação é o que impede G20 de se tornar uma caricatura total. É ela que sustenta a narrativa quando o roteiro vacila e seus olhares de determinação e vulnerabilidade dão textura a um enredo que por vezes se perde em meio a explosões e discursos. Ainda assim, há um limite para o que um único desempenho pode salvar.
O roteiro, assinado por Caitlin Parrish, Erica Weiss, Logan Miller e Noah Miller, é o ponto mais frágil do projeto. É uma história que começa como um drama político, se transforma num filme de ação claustrofóbico e termina como uma fábula moral sobre coragem e democracia. Essa indecisão de gênero enfraquece o resultado final. Há bons momentos de tensão, especialmente nos trechos em que a presidente se vê isolada dentro do hotel tomado por terroristas, precisando usar inteligência e improviso para escapar. A direção de Riggen nesses instantes é segura: a câmera trabalha com o espaço confinado, explora a escuridão dos corredores e valoriza o som como elemento de suspense. A sequência em que Sutton atravessa um andar inteiro repleto de inimigos, guiada apenas pela intuição e pela memória espacial, é talvez o momento em que o filme realmente encontra sua força: uma síntese de ação e presença.
Mas G20 sofre de um problema recorrente em thrillers contemporâneos de grande orçamento: o excesso de explicação. Riggen e seus roteiristas parecem não confiar no poder da imagem ou da ação para comunicar significado. Cada virada de roteiro é seguida por longos diálogos expositivos, e a necessidade de explicar o que acabou de acontecer vai quebrando o ritmo narrativo. Em vez de mergulhar o espectador na experiência sensorial do caos, o filme o puxa de volta para a superfície racional da trama. É um erro de dosagem: falta silêncio, falta mistério, falta a coragem de deixar o público decifrar.
Antony Starr, como o vilão Edward Rutledge, entrega uma performance interessante, mas irregular. Ele é apresentado como um empresário carismático e manipulador, cuja inteligência tecnológica ameaça governos inteiros. O problema é que sua motivação nunca é totalmente clara, e o personagem oscila entre o realismo cínico e a pura megalomania. Starr tem presença, mas o roteiro o reduz a frases de efeito e planos genéricos. Sua vilania se perde em meio à cacofonia de discursos e tiros. O mesmo vale para os coadjuvantes: Anthony Anderson, Marsai Martin e Ramón Rodríguez cumprem funções narrativas, mas raramente ganham densidade. Há breves lampejos de humanidade, sobretudo nas interações entre mãe e filha, mas nada que se sustente por muito tempo.
Riggen, uma diretora que vinha de dramas mais intimistas, como Os 33 (2015), parece tentar provar aqui sua habilidade de comandar uma superprodução. Visualmente, ela entrega um filme robusto, com fotografia funcional e elegante, efeitos convincentes e um ritmo inicial que promete intensidade. Entretanto, à medida que o enredo avança, a direção perde o foco. As transições entre ação e discurso político se tornam truncadas, e o filme vai se esvaziando de tensão. Em certos momentos, a tentativa de equilibrar espetáculo e crítica social lembra o estilo de Força Aérea Um (1997), mas sem a coesão narrativa ou o charme clássico do gênero. É como se G20 quisesse ser ao mesmo tempo um comentário sobre o poder feminino e uma fantasia de ação desenfreada, sem se comprometer completamente com nenhum dos dois caminhos.
Ainda assim, há algo de fascinante na forma como o filme G20 encena uma mulher negra no centro do poder global. O simples fato de ver Viola Davis como presidente dos Estados Unidos já carrega um significado político que o filme, mesmo sem aprofundar, não consegue anular. É uma imagem que fala por si, e talvez o maior triunfo da obra esteja justamente nessa representação simbólica, mais do que em seu roteiro ou direção. Quando Sutton se levanta, coberta de sangue e poeira, diante de câmeras e aliados, afirmando que “a democracia resiste”, a cena pode parecer excessivamente patriótica, mas há uma sinceridade ali que transcende o clichê, apesar do mesmo ufanismo norte-americano apresentado em Independence Day.
No fim, G20 é um filme dividido entre o que quer dizer e o que consegue fazer. Tem fôlego de blockbuster e ideias de drama político, mas não harmoniza os dois registros. A ação empolga, o discurso pesa, e a coerência se dilui. Ainda assim, há momentos de pura intensidade cinematográfica e uma performance central que vale a experiência. Viola Davis, com sua presença colossal, transforma um roteiro vacilante em algo que, ao menos por instantes, parece importante. Talvez o maior mérito de G20 seja este: mesmo quando tudo ao redor se desmorona em clichês e artifícios, ela continua acreditando no poder de uma história para defender algo maior. E essa crença, em tempos de tanto cinismo, tem um valor inegável.
G20 (G20, 2025 / Estados Unidos)
Direção: Patricia Riggen
Roteiro: Caitlin Parrish, Erica Weiss, Logan Miller, Noah Miller
Com: Viola Davis, Anthony Anderson, Marsai Martin, Ramón Rodríguez, Antony Starr, Douglas Hodge, Elizabeth Marvel, Sabrina Impacciatore, Clark Gregg
Duração: 108 min.
Ari Cabral
Bacharel em Publicidade e Propaganda, profissional desde 2000, especialista em tratamento de imagem e direção de arte. Com experiência também em redes sociais, edição de vídeo e animação, fez ainda um curso de crítica cinematográfica ministrado por Pablo Villaça. Cinéfilo, aprendeu a ser notívago assistindo TV de madrugada, o único espaço para filmes legendados na TV aberta.
G20
2025-11-19T08:30:00-03:00
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