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Moonwalker
Há algo de estranho em revisitar Moonwalker, aquela colagem de videoclipes de 1988 em que Michael Jackson parece ter tentado traduzir seu universo em movimento e sonhos. Não é um filme tradicional; e é justamente aí que reside seu fascínio indecifrável. O que temos é um experimento antológico, cheio de clipes estendidos que, em sua maioria, não se conectam narrativamente, mas dialogam entre si pela intensidade da presença de seu intérprete.
O segmento de Smooth Criminal desponta como centro dramático: Jackson encarna um herói que confronta um vilão infantilizado, interpretado por Joe Pesci, num jogo de fantasia policial, clichê e que beira o infantil. Por isso mesmo, é fascinante. É coreografia, design de produção, câmera, um show completo, ainda que sem toque de leveza, o que o torna, por vezes, deslocado. Essa escolha artística exacerbou o descompasso entre o visual ambicioso e a coerência narrativa, fazendo do filme uma mistura confusa, que oscila entre videoclipe, musical, retrospectiva e conto infantil.
Na veia sensorial, o clipe animado Leave Me Alone surge como uma crítica mordaz à imprensa sensacionalista e é, de longe, o momento mais inventivo. É ágil no ritmo e crítico na sátira dos boatos sobre Jackson, convertendo o absurdo em poesia irônica. Não surpreende que tenha levado o Grammy e o Cannes Gold Lion de efeitos especiais.
Há também instantes de pura presença performática: as sequências de Man in the Mirror e Come Together, junto com The Moon Is Walking interpretado pelo grupo Ladysmith Black Mambazo, oferecem o que parecia faltar. É Jackson simplesmente fazendo o que sabe: cantar, dançar, se tornar magnético. Esses respiros de simplicidade são os verdadeiros pontos de encontro entre artista e público.
Como era de se esperar em algo tão experimental, nem tudo funciona. Em alguns trechos, como nas sequências de animação em stop motion ou nas interações com crianças, há uma sensação de infantilização pesada, um excesso de produção que, em vez de elevar a obra, a sufoca. É como se o filme se movesse como num devaneio, às vezes brilhante, às vezes truncado, e isso pode frustrar quem busca alguma coerência narrativa.
Vejo Moonwalker como uma ode à grandiosidade e à imperfeição de um artista que se negava a se encaixar. É um manifesto audiovisual de Michael Jackson, carregado de ambição, contradição, beleza excessiva e respiros de pura musicalidade. Se há um momento emblemático desse caldeirão, é Smooth Criminal: ali se encarna tudo que caracteriza a obra. O domínio da dança, a teatralidade escalonada e o salto criativo que escala a música ao cinema. E ressalta também sua grande dificuldade: a estrutura que não se sustenta fora da aura do performer.
No fim, Moonwalker é uma viagem visual sobre a personagem que a vida de Michael construiu. Difícil de digerir como cinema, porém inegavelmente potente como arte pop. É um objeto estranho, sim, mas talvez porque nos lembra como a busca pela grandeza vira espetáculo, e como o espetáculo, por sua vez, pode ser incompleto, estranho e irresistível ao mesmo tempo.
Moonwalker (Moonwalker, 1988 / Estados Unidos)
Direção: Jerry Kramer, Colin Chilvers e Jim Blashfield
Roteiro: David Newman
Com: Michael Jackson, Sean Lennon, Kellie Parker, Brandon Quintin Adams, Joe Pesci
Duração: 93 min.

Ari Cabral
Bacharel em Publicidade e Propaganda, profissional desde 2000, especialista em tratamento de imagem e direção de arte. Com experiência também em redes sociais, edição de vídeo e animação, fez ainda um curso de crítica cinematográfica ministrado por Pablo Villaça. Cinéfilo, aprendeu a ser notívago assistindo TV de madrugada, o único espaço para filmes legendados na TV aberta.
Moonwalker
2025-10-01T08:30:00-03:00
Ari Cabral
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