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Na Estrada
Na Estrada
Em 1979, Francis Ford Coppola adquiriu os direitos de filmagem de um dos livros mais famosos do século 20. On the Road, escrito por Jack Kerouac é um símbolo da Geração Beat, famosa nos anos 50 e 60 por uma filosofia nômade que artistas adoraram nos Estados Unidos daquela época. A ideia continuaria no papel, se Coppola não visse Diário de uma Motocicleta e decidisse que era Walter Salles o homem para levar a trama para as telas.
Não é de se admirar a escolha. Parece que, desde o neo-realismo italiano, o brasileiro é o maior apaixonado por road movies que surgiu. Não apenas por Diário, que encantou Coppola, mas desde Central do Brasil, seu grande sucesso nacional. Mesmo quando não está literalmente na estrada, seus personagens estão sempre em movimento, em buscas, em reconstruções internas. Há uma inquietude na obra de Salles que se encaixa perfeitamente com a filosofia da Geração Beat.
A ideia é mais do que narra uma história: aproveitar o momento. Carpe diem, my boys, poderíamos parafrasear. Não há um mote, uma decisão repentina, um objetivo. Eles simplesmente iam com o vento, onde a vontade o levasse. Por isso, quem espera um roteiro cartesiano com a sinopse, pode se decepcionar. Sim, Dean Moriarty e Sal Paradise são amigos, o primeiro é o agente motivador, o segundo o agente observador, o narrador da trama e o alter-ego do escritor Jack Kerouac. E sim, Marylou constrói uma espécie de triângulo amoroso com os amigos, quando eles estão na estrada. Mas, em essência temos as memórias de Sal na tela, sem necessariamente criar um conflito direto a ser resolvido.
Na Estrada é, então, um filme lírico, sensorial que tem que ser encarado com essa mesma leveza instintiva. É para curtir a filosofia do movimento a partir das belas paisagens dos Estados Unidos que começa na famosa Rota 66, seguindo por diversas cidades e estados e chegando até o México. É também um deleite sonoro, com uma trilha referente da época, principalmente o jazz, construída com cuidado pelo músico argentino Gustavo Santaolalla. Tudo isso em um ritmo próprio que vai nos envolvendo na cadência da vida daquelas pessoas.
O elenco é outro ponto que chama a atenção. Não exatamente pelo trio protagonista vivido por Garrett Hedlund, Sam Riley e Kristen Stewart, mas pelo peso das participações especiais. Temos bons momentos na tela com Kirsten Dunst, Amy Adams, Elisabeth Moss, Viggo Mortensen, em uma bela interpretação do poeta Old Bull Lee, e a brasileira Alice Braga. São momentos curtos, é verdade, mas que engrandecem a trama, afinal, se os protagonistas estão em movimento, a cada parada pessoas passam por suas vidas.
A direção de Walter Salles é delicada, com enquadramentos pouco invasivos, detalhes de estradas, de paisagens passando. Enquadramentos poéticos, com objetos emoldurando cenas e algumas cenas de observação. Há também uma preocupação na direção dos atores que pontuam as situações pelo olhar estrangeiro, como a cena de sexo entre Alice Braga e Sam Riley, que vive o personagem Sal, com o garotinho observando. Ou a cena do jantar de ação de graças, com as expressões incrédulas da família de Sal.
Mas, essa escolha de observação acaba nos afastando um pouco dos sentimentos dos personagens. É um filme estético, não emocional. Vemos seus dramas de uma forma distante, sem grande envolvimento. Isso tanto nos momentos divertidos em festas, orgias sexuais ou experiências com drogas (principalmente a maconha e a benzedrina, que aparece mais pelas embalagens usadas), quando nos momentos difíceis, da falta de dinheiro, das pequenas decadências, das brigas familiares. Isso também pode causar estranhamento nos corações mais quentes, talvez por isso, a crítica americana tenha tido ressalvas, enquanto a francesa adorou.
On the Road é uma experiência. "Mexa os pés como se fizesse sentido, como se estivesse viva. Viva a vida", grita um personagem em determinado momento. A ideia é essa mesma, deixar o filme te levar sem procurar muitos sentidos, sem querer uma catarse emocional, ou mesmo um conflito para torcer pelos protagonistas. Um recorte de uma geração que marcou seu tempo e viveu sem se preocupar com futuro, próximo ou distante. Então, siga o ritmo.
Na Estrada (On the Road, 2012 / EUA)
Direção: Walter Salles
Roteiro: Jose Rivera
Com: Garrett Hedlund, Sam Riley, Kristen Stewart, Kirsten Dunst e Alice Braga
Duração: 137 min.
Não é de se admirar a escolha. Parece que, desde o neo-realismo italiano, o brasileiro é o maior apaixonado por road movies que surgiu. Não apenas por Diário, que encantou Coppola, mas desde Central do Brasil, seu grande sucesso nacional. Mesmo quando não está literalmente na estrada, seus personagens estão sempre em movimento, em buscas, em reconstruções internas. Há uma inquietude na obra de Salles que se encaixa perfeitamente com a filosofia da Geração Beat.
A ideia é mais do que narra uma história: aproveitar o momento. Carpe diem, my boys, poderíamos parafrasear. Não há um mote, uma decisão repentina, um objetivo. Eles simplesmente iam com o vento, onde a vontade o levasse. Por isso, quem espera um roteiro cartesiano com a sinopse, pode se decepcionar. Sim, Dean Moriarty e Sal Paradise são amigos, o primeiro é o agente motivador, o segundo o agente observador, o narrador da trama e o alter-ego do escritor Jack Kerouac. E sim, Marylou constrói uma espécie de triângulo amoroso com os amigos, quando eles estão na estrada. Mas, em essência temos as memórias de Sal na tela, sem necessariamente criar um conflito direto a ser resolvido.
Na Estrada é, então, um filme lírico, sensorial que tem que ser encarado com essa mesma leveza instintiva. É para curtir a filosofia do movimento a partir das belas paisagens dos Estados Unidos que começa na famosa Rota 66, seguindo por diversas cidades e estados e chegando até o México. É também um deleite sonoro, com uma trilha referente da época, principalmente o jazz, construída com cuidado pelo músico argentino Gustavo Santaolalla. Tudo isso em um ritmo próprio que vai nos envolvendo na cadência da vida daquelas pessoas.
O elenco é outro ponto que chama a atenção. Não exatamente pelo trio protagonista vivido por Garrett Hedlund, Sam Riley e Kristen Stewart, mas pelo peso das participações especiais. Temos bons momentos na tela com Kirsten Dunst, Amy Adams, Elisabeth Moss, Viggo Mortensen, em uma bela interpretação do poeta Old Bull Lee, e a brasileira Alice Braga. São momentos curtos, é verdade, mas que engrandecem a trama, afinal, se os protagonistas estão em movimento, a cada parada pessoas passam por suas vidas.
A direção de Walter Salles é delicada, com enquadramentos pouco invasivos, detalhes de estradas, de paisagens passando. Enquadramentos poéticos, com objetos emoldurando cenas e algumas cenas de observação. Há também uma preocupação na direção dos atores que pontuam as situações pelo olhar estrangeiro, como a cena de sexo entre Alice Braga e Sam Riley, que vive o personagem Sal, com o garotinho observando. Ou a cena do jantar de ação de graças, com as expressões incrédulas da família de Sal.
Mas, essa escolha de observação acaba nos afastando um pouco dos sentimentos dos personagens. É um filme estético, não emocional. Vemos seus dramas de uma forma distante, sem grande envolvimento. Isso tanto nos momentos divertidos em festas, orgias sexuais ou experiências com drogas (principalmente a maconha e a benzedrina, que aparece mais pelas embalagens usadas), quando nos momentos difíceis, da falta de dinheiro, das pequenas decadências, das brigas familiares. Isso também pode causar estranhamento nos corações mais quentes, talvez por isso, a crítica americana tenha tido ressalvas, enquanto a francesa adorou.
On the Road é uma experiência. "Mexa os pés como se fizesse sentido, como se estivesse viva. Viva a vida", grita um personagem em determinado momento. A ideia é essa mesma, deixar o filme te levar sem procurar muitos sentidos, sem querer uma catarse emocional, ou mesmo um conflito para torcer pelos protagonistas. Um recorte de uma geração que marcou seu tempo e viveu sem se preocupar com futuro, próximo ou distante. Então, siga o ritmo.
Na Estrada (On the Road, 2012 / EUA)
Direção: Walter Salles
Roteiro: Jose Rivera
Com: Garrett Hedlund, Sam Riley, Kristen Stewart, Kirsten Dunst e Alice Braga
Duração: 137 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Na Estrada
2012-07-14T08:30:00-03:00
Amanda Aouad
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