
Aristóteles já dizia que devemos preferir algo crível, que seja mentira do que uma verdade que seja incrível. É o que chamamos de
verossimilhança em uma trama, e nos faz acreditar que dentro de determinado universo um ser como Super-homem seja possível. Enquanto que histórias que realmente aconteceram, às vezes, se tornam tão absurdas que não parecem críveis quando postas em tela.
A história que
Michael Bay dirigiu em
Sem Dor, Sem Ganho, é assim, tão absurda, com personagens tão imbecis, que é incrível demais para qualquer pessoa com um mínimo senso acreditar. Mas, aí, os roteiristas
Christopher Markus e
Stephen McFeely encontraram um caminho que nem mesmo o filósofo grego pensou: simplesmente não se levar a sério e fazer piada do
ridículo. Literalmente, em determinado momento do
filme tem até um aviso na tela dizendo: sim, isso ainda é baseado em uma história real.

Com essa ironia,
Sem Dor, Sem Ganho acaba se tornando um
filme bastante interessante. É divertido, tem um ótimo ritmo e situações tão absurdas, que ao mesmo tempo que nos assustam, nos divertem ainda mais. Como um churrasco sem noção. Claro que deve haver alguns exageros, como o personagem de
Mark Wahlberg sempre começar a malhar quando está nervoso. E muita coisa não teve ter acontecido exatamente daquele jeito. Mas, pouco importa. O
filme consegue nos passar a noção exata desse projeto de golpe onde tudo que tinha para dar errado, deu.

O trio principal consegue uma boa química, construindo suas personalidades de maneira bem divertida.
Mark Wahlberg é o mentor do crime, um
personal trainer que se inspira em palestras de auto-ajuda para se tornar um "realizador" e resolve cortar caminho, sequestrando e roubando seu principal cliente.
Dwayne Johnson é um ex-detento e viciado em drogas que se converteu ao cristianismo. É divertido ver o homem mais forte de todos agir quase como uma criança ingênua, com atitudes
ridículas. Já
Anthony Mackie é o aprendiz deslumbrado. Três fortões, que querem subir na vida, sem muito esforço, mas tudo acaba pior do que imaginavam. Já o sequestrado é um homem arrogante, quase intragável, interpretado por
Tony Shalhoub, nosso eterno Monk, o que segura boa parte das cenas absurdas devido ao seu talento.
Mas, o que surpreende mesmo é a direção de
Michael Bay. Longe das famosas explosões e cortes excessivos, o diretor consegue construir um efeito de câmera bem interessante, fazendo-a percorrer caminhos, entrando e saindo de frestas e criando uma dinâmica de imagens muito funcional para a trama. A
ação se torna mais dinâmica e gera também suspense e tensão em doses bem divididas. A gente consegue abstrair muita coisa pela forma como a câmera nos envolve.

E impressiona também como uma história que poderia ser trágica se torna risível diante do
absurdo que é. Não apenas pelos personagens que parecem ter deficiência mental, mas pela situação em si, pela atitude dos demais envolvidos, pela facilidade com que eles vão construindo o
golpe, e dificuldades que têm a partir do momento em que a vítima está no galpão. A começar pela pista construída com o perfume barato com cheiro enjoativo, muito antes da sua importância no desenrolar do
golpe.
Não podemos dizer que seja um grande
filme, que entre para a história do
cinema, ou algo parecido. Mas, diante do que se propõe,
Sem Dor, Sem Ganho consegue se reinventar e encontrar soluções muito bem realizadas para construir um
filme de ação com
comédia competente. Envolvente e divertido, ao contrário de muitas repetições atuais. Uma grata surpresa vinda de um diretor que vem de obras tão lamentáveis. Como disse, o colega
Lucas Ravazzano, o melhor
filme de
Michael Bay desde A Rocha (1996).
Sem Dor, Sem Ganho (Pain & Gain, 2013 / EUA)
Direção: Michael Bay
Roteiro: Christopher Markus e Stephen McFeely
Com: Mark Wahlberg, Dwayne Johnson, Anthony Mackie, Tony Shalhoub, Ed Harris, Rebel Wilson
Duração: 129 min.