O Duplo
Inspirado no livro de Fyodor Dostoyevsky, O Duplo perde muito do sentido ao ser tirado do contexto histórico em que foi pensado. Ainda assim, tem mensagens que instigam e nos fazem pensar.
Tímido e solitário, Simon James vive do seu trabalho e de admirar sua vizinha Hannah da janela. Até que um dia chega ao seu trabalho James Simon, um rapaz que tem a mesma fisionomia sua, mas uma personalidade completamente oposta. E que vai tomando todos os espaços aos poucos, até não sobrar muito para Simon de sua própria vida.
Quando Dostoyevsky criou esta história, a Europa vivia o impacto dos ideais de Friedrich Engels e Karl Marx. O social parecia fazer parte do sonho de igualdade e justiça no mundo. Mas, é algo que é inerente ao ser humano a necessidade de preservar sua própria identidade. Sufocado em uma sociedade intrusa, o protagonista busca a preservação de sua individualidade enquanto pessoa.
A sociedade em O Duplo de Richard Ayoade é uma espécie de suspensão da realidade que nos lembra muito a estética distópica da sociedade de 1984. Um mundo que parece o futuro, ao mesmo tempo que se organiza com um design passado, retrô, construindo uma realidade insólita onde tudo soa estranho, principalmente as pessoas.
Mesmo antes de James Simon surgir. Simon James já se sente deslocado. É um metrô vazio onde ele tem que ficar em pé porque uma pessoa disse que ele estava sentado em seu lugar. É quase não conseguir descer do veículo, deixando sua pasta na porta. É não ser reconhecido pelo porteiro do prédio onde trabalha há sete anos.
Ver a si mesmo refletido em outro homem, tão expansivo, alegre e sociável é como ser apagado aos poucos e o roteiro de Richard Ayoade e Avi Korine faz questão de mostrar isso nos mínimos detalhes. Desde um pontapé no elevador que tem consequência diferente para cada um até a reação das mulheres ao falar com ele.
Jesse Eisenberg consegue um bom resultado como Simon e James, construindo uma visível diferença na postura corporal, no olhar, na forma de falar e até mesmo no tom de voz que diferencia muito bem um personagem do outro. A cena do restaurante onde eles pedem algo para comer, por exemplo, é impressionante. Ou quando os dois disputam a personagem de Mia Wasikowska.
Talvez a trama possa se afastar do grande público por caminhar por um tom de fantasia e construir um mundo tão insólito, que nos lembra algo do mundo de Charlie Kaufman como em Quero Ser John Malkovich. Mas, trata de um tema que instiga e mexe com o espectador que, ao se colocar no lugar de Simon, também quer se impor enquanto pessoa.
O problema é que toda essa energia não parece canalizada e o diretor acaba se perdendo em ideias, ideais e necessidade de construir sua marca própria tornando a narrativa cada vez menos palatável, perdendo o ritmo e tornando cansativo no final.
De qualquer maneira, O Duplo é um filme instigante. Não aprofunda o tema que desenvolve e poderia ser melhor conduzido em alguns pontos, mas, de qualquer maneira, consegue despertar nossa curiosidade e nos manter envolvidos com o destino de Simon na busca por si mesmo.
O Duplo (The Double, 2013 / Reino Unido)
Direção: Richard Ayoade
Roteiro: Richard Ayoade, Avi Korine
Com: Jesse Eisenberg, Mia Wasikowska, Wallace Shawn
Duração: 93 min.
Tímido e solitário, Simon James vive do seu trabalho e de admirar sua vizinha Hannah da janela. Até que um dia chega ao seu trabalho James Simon, um rapaz que tem a mesma fisionomia sua, mas uma personalidade completamente oposta. E que vai tomando todos os espaços aos poucos, até não sobrar muito para Simon de sua própria vida.
Quando Dostoyevsky criou esta história, a Europa vivia o impacto dos ideais de Friedrich Engels e Karl Marx. O social parecia fazer parte do sonho de igualdade e justiça no mundo. Mas, é algo que é inerente ao ser humano a necessidade de preservar sua própria identidade. Sufocado em uma sociedade intrusa, o protagonista busca a preservação de sua individualidade enquanto pessoa.
A sociedade em O Duplo de Richard Ayoade é uma espécie de suspensão da realidade que nos lembra muito a estética distópica da sociedade de 1984. Um mundo que parece o futuro, ao mesmo tempo que se organiza com um design passado, retrô, construindo uma realidade insólita onde tudo soa estranho, principalmente as pessoas.
Mesmo antes de James Simon surgir. Simon James já se sente deslocado. É um metrô vazio onde ele tem que ficar em pé porque uma pessoa disse que ele estava sentado em seu lugar. É quase não conseguir descer do veículo, deixando sua pasta na porta. É não ser reconhecido pelo porteiro do prédio onde trabalha há sete anos.
Ver a si mesmo refletido em outro homem, tão expansivo, alegre e sociável é como ser apagado aos poucos e o roteiro de Richard Ayoade e Avi Korine faz questão de mostrar isso nos mínimos detalhes. Desde um pontapé no elevador que tem consequência diferente para cada um até a reação das mulheres ao falar com ele.
Jesse Eisenberg consegue um bom resultado como Simon e James, construindo uma visível diferença na postura corporal, no olhar, na forma de falar e até mesmo no tom de voz que diferencia muito bem um personagem do outro. A cena do restaurante onde eles pedem algo para comer, por exemplo, é impressionante. Ou quando os dois disputam a personagem de Mia Wasikowska.
Talvez a trama possa se afastar do grande público por caminhar por um tom de fantasia e construir um mundo tão insólito, que nos lembra algo do mundo de Charlie Kaufman como em Quero Ser John Malkovich. Mas, trata de um tema que instiga e mexe com o espectador que, ao se colocar no lugar de Simon, também quer se impor enquanto pessoa.
O problema é que toda essa energia não parece canalizada e o diretor acaba se perdendo em ideias, ideais e necessidade de construir sua marca própria tornando a narrativa cada vez menos palatável, perdendo o ritmo e tornando cansativo no final.
De qualquer maneira, O Duplo é um filme instigante. Não aprofunda o tema que desenvolve e poderia ser melhor conduzido em alguns pontos, mas, de qualquer maneira, consegue despertar nossa curiosidade e nos manter envolvidos com o destino de Simon na busca por si mesmo.
O Duplo (The Double, 2013 / Reino Unido)
Direção: Richard Ayoade
Roteiro: Richard Ayoade, Avi Korine
Com: Jesse Eisenberg, Mia Wasikowska, Wallace Shawn
Duração: 93 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
O Duplo
2015-03-02T08:30:00-03:00
Amanda Aouad
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