
A história é mais do que conhecida, o drama vivido é intenso e todas as emoções são exacerbadas. Ver atores conhecidos cantando pode distanciar da trama e nos fazer não embarcar completamente naquilo, mas se comportar como quem assiste a um espetáculo simplesmente. Talvez por isso, Os Miseráveis tenha tido reações tão frias em alguns lugares. Porém, há uma carga tão forte ali que merece um olhar mais cuidadoso. Isso sem falar na entrega dos atores que se doam de fato a seus personagens com dignidade.

Por outro lado, a postura "lawful neutral" de Javert pode assustar alguns. Um homem que vive para a lei e só acredita nisso, acima de qualquer outra questão, chega a ser estranho. Ele não é bom, nem mal, apenas segue o código estabelecido sem questionamentos e, assim, comete injustiças que na visão dele nada mais são do que o cumprimento do dever. Aliás, questão como honra e dever estão tão escassas hoje em dia que muita coisa na história pode soar estranho, exagerado e sem sentido aos olhares atuais. Atitudes como o do próprio Jean Valjean que escolhe pelo certo em momentos em que muitos prefeririam outros caminhos.

O espetáculo enche aos olhos, ainda que atores não sejam os melhores sopranos e tenores possíveis. A interpretação é o foco. Tanto que Tom Hooper optou por captação direta das canções no set de filmagem. O protagonista Hugh Jackman, ainda que deslocado de seu tom, já que não é tenor, não decepciona. A entrega que tem a Jean Valjean nos convence e emociona. Assim como Anne Hathaway que tem uma construção de Fantine tão crível que nos proporciona momentos sublimes desde seus primeiros olhares na fábrica.

Porém, se a história é conhecida, os atores estão ótimos e a fotografia nos oferece um bom espetáculo, não podemos dizer o mesmo da direção de Tom Hooper que chega a ser preguiçosa em alguns momentos. Repete muito os planos, trabalha sempre com profundidade de campo baixíssima, focando sempre o personagem que canta e nos dá um ritmo frenético na montagem que cansa em alguns momentos. Acabou sendo mais do que justa, sua não indicação ao Oscar.
Os Miseráveis é um filme-espetáculo. Bem feito, com músicas mais do que conhecidas e admiradas, atores em grande performance e uma trama social e política que ainda tem pontos de reflexão importantes. Quem embarcar na proposta, sairá satisfeito do cinema.
Os Miseráveis (Les Misérables, 2012 / EUA)
Direção: Tom Hooper
Roteiro: William Nicholson*
Com: Hugh Jackman, Russell Crowe, Anne Hathaway, Amanda Seyfried, Sacha Baron Cohen, Helena Bonham Carter, Eddie Redmayne e Samantha Barks
Duração: 158 min.
*romance original de Victor Hugo. Musical: Claude-Michel Schönberg. Texto original francês: Jean-Marc Natel e Alain Boublil. Músicas: Herbert Kretzmer.