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J. Edgar
J. Edgar
Clint Eastwood se consagrou como diretor, sua mão firme para construir bons melodramas chamou a atenção do mundo em filmes como As Pontes de Madison, Sobre Meninos e Lobos, Menina de Ouro, A Troca, Além da Vida, entre tantos outros. Não por acaso Leonardo DiCaprio aceitou menos de 90% do seu cachê habitual para trabalhar nesse filme. Pena que a junção do grande diretor com o excelente ator deu apenas um filme morno, interessante pela figura que representa, mas que poderia render muito mais.
John Edgar Hoover pode ser um nome pouco conhecido para nós brasileiros, mas nos Estados Unidos ele representa muito, para o bem e para o mal. Ele foi o homem por trás da transformação do FBI (Federal Bureau of Investigation) de um Bureau desqualificado e desacreditado em um exemplo de coorporação investigativa. Foi ele também o responsável pela caça as bruxas que perseguiu, deportou e prendeu diversos comunistas no país. E foi o inimigo número um dos gângsters durante a Lei Seca. J. Edgar Hoover mudou os Estados Unidos em vários aspectos. Dustin Lance Black já tem experiência com figuras políticas e públicas por ter assinado o roteiro de Milk e seu roteiro busca conhecer o homem por trás do mito, humanizando-o, mas ao mesmo tempo demonstrando o quão cruel e irritante ele deveria ser.
O filme já é válido só por nos apresentar essa figura histórica desde o início de sua carreira quando tinha apenas 24 anos e presenciou os primeiros ataques de radicais comunistas ao senado norte-americano até o fim dos seus dias. Clint Eastwood opta por não construir uma narrativa baseada em um fato específico, ou mesmo construir um clímax em especial. É mesmo uma cinebiografia que vai pincelando os fatos principais da vida do agente mais poderoso do país. E consegue passar, mesmo para os que estão completamente por fora da história dos Estados Unidos uma trama coerente e instigante. Para os amantes do passado político, vai ser ótimo ver casos como a vida dos Kennedy, sua preocupação com os comunistas, o período da Lei Seca com Al Capone sendo perseguido e, nos cinemas, sendo lançado Inimigo do Estado, a preocupação de Richard Nixon com os possíveis dossiês de Hoover, que nos faz lembrar o caso de Watergate. Mas, há também omissões de questões mais delicadas do passado de J. Edgar, como sua homofobia, machismo e racismo que ficam apenas subentendidas em algumas cenas.
Mas, mais interessante do que a figura pública, as referências históricas e os acontecimentos mundiais é a característica que Clint Eastwood sabe fazer como ninguém, nos aproximar dessa figura exótica tentando entendê-lo por dentro. Aí, entra a figura fundamental na história: Anne Marie Hoover, a mãe de J.Edgar. Sua postura autoritária, sempre controlando o filho, até na cor da gravata que irá usar, é fundamental para formação do seu caráter. A dependência emocional dele a ela é visível desde os primeiros minutos de filme e quase o redime de suas ações condenáveis, o que também é perigoso ao lembrar que Clint Eastwood é um republicano conservador. É o típico homem sufocado pela dominância materna, incapaz de agir normalmente diante do sexo oposto, por exemplo, vide a cena na biblioteca. E, claro, é atribuída a ela também, além da posição de destaque que ele ocupava, a nunca confirmação de sua homossexualidade. Aliás, a relação entre J. Edgar e Clyde Tolson é outra construção delicada de Eastwood, que gera os melhores momentos do filme.
A tarefa de encarnar esse homem contraditório não era fácil, mas Leonardo DiCaprio já demonstrou em diversos momentos sua capacidade e talento. Uma pena que aqui sua interpretação seja um pouco instável. Enquanto é jovem, DiCaprio consegue transmitir as hesitações, dilemas, medos e certezas de J. Edgar como ninguém. Impressiona e convence. O problema é a fase mais velha do personagem, quando a maquiagem o transforma em um senhor gordo, careca e rabugento, mas seus trejeitos e cacoetes tornam algo falso naquela figura em tela. Não conseguimos ver o velho J. Edgar, mas sim, o jovem DiCaprio fazendo um velho. E o pior é que a narração em voz over que nos conduz na história é desse homem. Uma pena. Já Armie Hammer consegue ser melhor sucedido como Clyde Tolson na fase final da vida, principalmente depois do AVC. Naomi Watts também está bem como a secretária Helen Gandy. Mas, a atuação que chama a atenção mesmo é a de Judi Dench como Anne Marie Hoover, incrível a emoção e força que transmite à personagem.
A montagem é outro destaque no filme, tendo bons momentos de fusão entre o jovem e o velho J. Edgar, com cortes que misturam as situações, construindo bons efeitos. Aliás, a direção de arte chama a atenção pelos detalhes das diversas épocas pelas quais o filme passeia, principalmente quando é o mesmo cenário e detalhes como janela, poltrona e objetos são modificados retratando bem a situação vivida. Temos ainda os figurinos e tudo mais relacionado a cada época retratada, assim como a reconstrução de eventos históricos nos mínimos detalhes. Clint Eastwood que assina ainda a trilha sonora do filme, nos conduz com temas leves e bons momentos, apesar de se tornar uma viagem cansativa devido a longa duração.
J. Edgar é, então, um bom filme. Bem feito, realizado e interpretado, mas, poderia ser melhor. Principalmente pelo talento dos envolvidos, que já demonstraram poder muito mais. Tem falhas, perde o ritmo em vários momentos, se torna cansativo e não convence por completo. Ainda assim é um instigante retrato de um homem que foi amado e odiado pelo seu povo, indo as últimas consequências para defender o país do que acreditava ser uma praga.
J. Edgar (J. Edgar: 2012 / EUA)
Direção: Clint Eastwood
Roteiro: Dustin Lance Black
Com: Leonardo DiCaprio, Armie Hammer, Naomi Watts, Judi Dench, Josh Lucas.
Duração: 137 min.
John Edgar Hoover pode ser um nome pouco conhecido para nós brasileiros, mas nos Estados Unidos ele representa muito, para o bem e para o mal. Ele foi o homem por trás da transformação do FBI (Federal Bureau of Investigation) de um Bureau desqualificado e desacreditado em um exemplo de coorporação investigativa. Foi ele também o responsável pela caça as bruxas que perseguiu, deportou e prendeu diversos comunistas no país. E foi o inimigo número um dos gângsters durante a Lei Seca. J. Edgar Hoover mudou os Estados Unidos em vários aspectos. Dustin Lance Black já tem experiência com figuras políticas e públicas por ter assinado o roteiro de Milk e seu roteiro busca conhecer o homem por trás do mito, humanizando-o, mas ao mesmo tempo demonstrando o quão cruel e irritante ele deveria ser.
O filme já é válido só por nos apresentar essa figura histórica desde o início de sua carreira quando tinha apenas 24 anos e presenciou os primeiros ataques de radicais comunistas ao senado norte-americano até o fim dos seus dias. Clint Eastwood opta por não construir uma narrativa baseada em um fato específico, ou mesmo construir um clímax em especial. É mesmo uma cinebiografia que vai pincelando os fatos principais da vida do agente mais poderoso do país. E consegue passar, mesmo para os que estão completamente por fora da história dos Estados Unidos uma trama coerente e instigante. Para os amantes do passado político, vai ser ótimo ver casos como a vida dos Kennedy, sua preocupação com os comunistas, o período da Lei Seca com Al Capone sendo perseguido e, nos cinemas, sendo lançado Inimigo do Estado, a preocupação de Richard Nixon com os possíveis dossiês de Hoover, que nos faz lembrar o caso de Watergate. Mas, há também omissões de questões mais delicadas do passado de J. Edgar, como sua homofobia, machismo e racismo que ficam apenas subentendidas em algumas cenas.
Mas, mais interessante do que a figura pública, as referências históricas e os acontecimentos mundiais é a característica que Clint Eastwood sabe fazer como ninguém, nos aproximar dessa figura exótica tentando entendê-lo por dentro. Aí, entra a figura fundamental na história: Anne Marie Hoover, a mãe de J.Edgar. Sua postura autoritária, sempre controlando o filho, até na cor da gravata que irá usar, é fundamental para formação do seu caráter. A dependência emocional dele a ela é visível desde os primeiros minutos de filme e quase o redime de suas ações condenáveis, o que também é perigoso ao lembrar que Clint Eastwood é um republicano conservador. É o típico homem sufocado pela dominância materna, incapaz de agir normalmente diante do sexo oposto, por exemplo, vide a cena na biblioteca. E, claro, é atribuída a ela também, além da posição de destaque que ele ocupava, a nunca confirmação de sua homossexualidade. Aliás, a relação entre J. Edgar e Clyde Tolson é outra construção delicada de Eastwood, que gera os melhores momentos do filme.
A tarefa de encarnar esse homem contraditório não era fácil, mas Leonardo DiCaprio já demonstrou em diversos momentos sua capacidade e talento. Uma pena que aqui sua interpretação seja um pouco instável. Enquanto é jovem, DiCaprio consegue transmitir as hesitações, dilemas, medos e certezas de J. Edgar como ninguém. Impressiona e convence. O problema é a fase mais velha do personagem, quando a maquiagem o transforma em um senhor gordo, careca e rabugento, mas seus trejeitos e cacoetes tornam algo falso naquela figura em tela. Não conseguimos ver o velho J. Edgar, mas sim, o jovem DiCaprio fazendo um velho. E o pior é que a narração em voz over que nos conduz na história é desse homem. Uma pena. Já Armie Hammer consegue ser melhor sucedido como Clyde Tolson na fase final da vida, principalmente depois do AVC. Naomi Watts também está bem como a secretária Helen Gandy. Mas, a atuação que chama a atenção mesmo é a de Judi Dench como Anne Marie Hoover, incrível a emoção e força que transmite à personagem.
A montagem é outro destaque no filme, tendo bons momentos de fusão entre o jovem e o velho J. Edgar, com cortes que misturam as situações, construindo bons efeitos. Aliás, a direção de arte chama a atenção pelos detalhes das diversas épocas pelas quais o filme passeia, principalmente quando é o mesmo cenário e detalhes como janela, poltrona e objetos são modificados retratando bem a situação vivida. Temos ainda os figurinos e tudo mais relacionado a cada época retratada, assim como a reconstrução de eventos históricos nos mínimos detalhes. Clint Eastwood que assina ainda a trilha sonora do filme, nos conduz com temas leves e bons momentos, apesar de se tornar uma viagem cansativa devido a longa duração.
J. Edgar é, então, um bom filme. Bem feito, realizado e interpretado, mas, poderia ser melhor. Principalmente pelo talento dos envolvidos, que já demonstraram poder muito mais. Tem falhas, perde o ritmo em vários momentos, se torna cansativo e não convence por completo. Ainda assim é um instigante retrato de um homem que foi amado e odiado pelo seu povo, indo as últimas consequências para defender o país do que acreditava ser uma praga.
J. Edgar (J. Edgar: 2012 / EUA)
Direção: Clint Eastwood
Roteiro: Dustin Lance Black
Com: Leonardo DiCaprio, Armie Hammer, Naomi Watts, Judi Dench, Josh Lucas.
Duração: 137 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
J. Edgar
2012-01-28T08:46:00-02:00
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