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Karim Aïnouz
Thiago Martins
O Abismo Prateado
O Abismo Prateado
Baseado na letra de Olhos nos Olhos, canção de Chico Buarque de Holanda, O Abismo Prateado retrata a dor do abandono. É mesmo um susto, um desespero ser pego de surpresa com um "eu não te amo mais". Mas, interessante que enquanto que a música de Chico foca em trabalhar a volta por cima, o filme de Karim fica na primeira parte do desespero. E um acaba complementando o outro.
Violeta, interpretada por Alessandra Negrini é uma dentista, bem resolvida, casada, com um filho de catorze anos que tem uma rotina ativa. Acorda cedo, vai para o trabalho de bicicleta, malha no horário livre, cuida da casa, do filho. Mas, um dia, sem mais nem menos, recebe uma mensagem em seu celular. É seu marido dizendo que vai viajar e não volta, pois não a ama mais. Qualquer um enlouqueceria, é verdade. Até porque terminar uma relação de mais de catorze anos através de uma mensagem em celular, é cruel.
Mas, mesmo sem saber que o filme se baseia em Olhos nos Olhos, é possível perceber que o casamento não vai bem. Pelo menos pelas reações e expressões de Djalma, interpretado por Otto Jr. São pequenos detalhes que demonstram o seu desconforto, mesmo quando estão tendo relações sexuais. Parece que falta ar a Djalma. Ao acordar no dia seguinte, está monossilábico, evita olhar a esposa nos olhos. Não sai da cama para tomar café com ela, como pediu. Parece ansioso em olhar para o filho, como se fosse mesmo uma despedida. Aquilo não estava bem mesmo.
Djalma sai de cena e Alessandra Negrini toma conta do filme de Karim Aïnouz com o arrebatamento emocional que o texto pede. São reações irracionais em cadência, construídas em imagens que ajudam a compor o sentimento. Como a construção em que a personagem vai procurar uma pessoa que não fica claro quem seja. Podemos interpretar como uma amiga, mas pelas poucas palavras, ela parece mais íntima de Djalma que dela, ao dizer coisas como "ele esperou demais".
Mas, o que chama a atenção nessa sequência é mesmo a forma como Karim constrói as sensações. A confusão na construção, os barulhos, o vai-e-vem de pessoas nos dá um vislumbre da própria confusão em que a personagem se encontra. Sem eixo, sem se entender, perdida em meio ao caos. A inquietação demonstrada fisicamente também é visível. Ela não consegue ficar parada. Entra e sai de quadro, desesperada de uma maneira muito instigante.
Violeta está tão confusa que chega a deixar o filho adolescente sozinho em casa dizendo que vai para Porto Alegre encontrar o marido. E acompanhamos sua jornada madrugada a dentro, enquanto espera o próximo voo que só sai às seis horas da manhã. Ela passeia de táxi sem rumo, toma banho em um motel, dança freneticamente em uma boate ao som de um dos hits de Flashdance com direito a repetição de passos e tudo, passeia por Copacabana e aí, sua sina começa a encontrar prumo.
É interessante essa jornada interna e externa construída por Karim Ainouz. O que não é surpresa em sua filmografia já que fez o mesmo em obras como Madame Satã ou em Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo. Embarcamos junto a Violeta na revolta do abandono, principalmente por ser por celular. E nessa busca por um novo sentido. Nos colocamos juntos de certas peças-chaves e da forma como tudo vai se encaminhando para a resolução. Só incomoda um pouco a forma como a própria música se insere na trama. Um jogo que acaba sendo um pouco forçado, mesmo que tenha uma deixa ainda na praia. "Acho que meu marido me abandonou". A versão gravada por Bárbara Eugênia também parece carecer de emoção, não traz o impacto que deveria.
Porém, a simbologia dela ali, acaba sendo um complemento essencial para aquilo, como já é costume nas obras do diretor. As possibilidades de futuro após aquela madrugada traumática. Nada está definido, nada é mesmo definitivo. Mas, Violeta está lá com uma vida pela frente, encarando a dor em sua jornada e seguindo em frente. Pouco importa a história linear, a narrativa. O que vale aqui é a experiência vivida. As sensações passadas. A construção do não-dito. Aquilo que só os olhos podem mesmo revelar, já que são eles a janela de nossa alma.
O Abismo Prateado (O Abismo Prateado, 2011 / Brasil)
Direção: Karim Aïnouz
Roteiro: Beatriz Bracher
Com: Alessandra Negrini, Thiago Martins, Gabriela Pereira, Carla Ribas, Alice Borges, João Vitor da Silva, Rebecca Orenstein
Duração: 83 min.
Violeta, interpretada por Alessandra Negrini é uma dentista, bem resolvida, casada, com um filho de catorze anos que tem uma rotina ativa. Acorda cedo, vai para o trabalho de bicicleta, malha no horário livre, cuida da casa, do filho. Mas, um dia, sem mais nem menos, recebe uma mensagem em seu celular. É seu marido dizendo que vai viajar e não volta, pois não a ama mais. Qualquer um enlouqueceria, é verdade. Até porque terminar uma relação de mais de catorze anos através de uma mensagem em celular, é cruel.
Mas, mesmo sem saber que o filme se baseia em Olhos nos Olhos, é possível perceber que o casamento não vai bem. Pelo menos pelas reações e expressões de Djalma, interpretado por Otto Jr. São pequenos detalhes que demonstram o seu desconforto, mesmo quando estão tendo relações sexuais. Parece que falta ar a Djalma. Ao acordar no dia seguinte, está monossilábico, evita olhar a esposa nos olhos. Não sai da cama para tomar café com ela, como pediu. Parece ansioso em olhar para o filho, como se fosse mesmo uma despedida. Aquilo não estava bem mesmo.
Djalma sai de cena e Alessandra Negrini toma conta do filme de Karim Aïnouz com o arrebatamento emocional que o texto pede. São reações irracionais em cadência, construídas em imagens que ajudam a compor o sentimento. Como a construção em que a personagem vai procurar uma pessoa que não fica claro quem seja. Podemos interpretar como uma amiga, mas pelas poucas palavras, ela parece mais íntima de Djalma que dela, ao dizer coisas como "ele esperou demais".
Mas, o que chama a atenção nessa sequência é mesmo a forma como Karim constrói as sensações. A confusão na construção, os barulhos, o vai-e-vem de pessoas nos dá um vislumbre da própria confusão em que a personagem se encontra. Sem eixo, sem se entender, perdida em meio ao caos. A inquietação demonstrada fisicamente também é visível. Ela não consegue ficar parada. Entra e sai de quadro, desesperada de uma maneira muito instigante.
Violeta está tão confusa que chega a deixar o filho adolescente sozinho em casa dizendo que vai para Porto Alegre encontrar o marido. E acompanhamos sua jornada madrugada a dentro, enquanto espera o próximo voo que só sai às seis horas da manhã. Ela passeia de táxi sem rumo, toma banho em um motel, dança freneticamente em uma boate ao som de um dos hits de Flashdance com direito a repetição de passos e tudo, passeia por Copacabana e aí, sua sina começa a encontrar prumo.
É interessante essa jornada interna e externa construída por Karim Ainouz. O que não é surpresa em sua filmografia já que fez o mesmo em obras como Madame Satã ou em Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo. Embarcamos junto a Violeta na revolta do abandono, principalmente por ser por celular. E nessa busca por um novo sentido. Nos colocamos juntos de certas peças-chaves e da forma como tudo vai se encaminhando para a resolução. Só incomoda um pouco a forma como a própria música se insere na trama. Um jogo que acaba sendo um pouco forçado, mesmo que tenha uma deixa ainda na praia. "Acho que meu marido me abandonou". A versão gravada por Bárbara Eugênia também parece carecer de emoção, não traz o impacto que deveria.
Porém, a simbologia dela ali, acaba sendo um complemento essencial para aquilo, como já é costume nas obras do diretor. As possibilidades de futuro após aquela madrugada traumática. Nada está definido, nada é mesmo definitivo. Mas, Violeta está lá com uma vida pela frente, encarando a dor em sua jornada e seguindo em frente. Pouco importa a história linear, a narrativa. O que vale aqui é a experiência vivida. As sensações passadas. A construção do não-dito. Aquilo que só os olhos podem mesmo revelar, já que são eles a janela de nossa alma.
O Abismo Prateado (O Abismo Prateado, 2011 / Brasil)
Direção: Karim Aïnouz
Roteiro: Beatriz Bracher
Com: Alessandra Negrini, Thiago Martins, Gabriela Pereira, Carla Ribas, Alice Borges, João Vitor da Silva, Rebecca Orenstein
Duração: 83 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
O Abismo Prateado
2013-05-12T08:30:00-03:00
Amanda Aouad
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