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Deixe a Luz do Sol Entrar
Deixe a Luz do Sol Entrar
Deixe a Luz do Sol Entrar aparentemente é diferente de tudo que a cineasta Claire Denis já fez. Inspirado no livro "Fragmentos de um Discurso Amoroso", do filósofo francês Roland Barthes, creditado inclusive no IMDB, ainda que a mesma tenha negado em algum momento a inspiração, o filme nos traz a protagonista Isabelle em suas desventuras amorosas pela capital francesa enquanto tenta desenvolver a sua carreira de artista plástica.
Ainda que tenha uma premissa de comédia romântica, com um humor irônico nos diálogos e algumas situações engraçadas, no entanto, o filme acaba sendo uma constatação incômoda de que o amor não é esse conto de fadas ensinado nos livros infantis ou mesmo nos ideais românticos de poemas e versos que nos querem fazer crer na beleza do sentimento a dois. É uma visão amarga de uma tentativa eterna da busca pelo parceiro ideal em uma visão feminina bastante crítica e complexa que acaba por nos trazer de volta à cineasta de temas densos como Desejo e Obsessão, por exemplo.
Mas, de fato, há uma leveza na protagonista Isabelle, ainda que insegura, carente e sempre se deixando levar por atitudes dos homens que a cercam. Mas que também tem a capacidade de conduzir essas conturbadas relações controlando os limites entre o sim e o não. Uma mulher em transformação que parece em constante insatisfação com o outro, porque, na verdade, está insatisfeita consigo mesma. Talvez seja isso que a cena final acabe lhe revelando em metáforas.
O grande chamariz do filme, acaba sendo Juliette Binoche. A complexidade de Isabelle e as curvas incertas de sua progressão dramática são um palco para que a atriz possa desenvolver todo o seu talento e capacidade de transitar entre emoções de alegria e dor com uma naturalidade impressionante. É também um exercício de carisma, já que por mais que seja inconstante e incongruente, não conseguimos nos descolar dessa mulher capaz de exalar extrema empatia em tela. Com outra atriz, talvez a obra não funcionasse tão bem.
A câmera de Claire Denis acompanha Binoche ressignificando espaços através de seus gestos, majoritariamente em locais fechados ainda que tenha Paris como cenário como uma forma de traduzir essa sensação internada da personagem em constante angústia, como se estivesse presa a algo, sufocada por uma estrutura claustrofóbica onde apenas sua arte pudesse ser escape quando entram belos planos em plongée com ela pintando.
Quase como uma súplica que é feita à protagonista, Deixe a Luz do Sol Entrar é uma espécie de busca por si mesmo. Uma compreensão do que se é e o que se deseja, um alerta da necessidade de se preencher por si mesmo, pois não é possível encontrar no outro essa completude. O outro é apenas um companheiro de jornada com o qual compartilhamos momentos. É possível encontrar um companheiro ideal para uma vida inteira, mas não é justo que se espere que ele te complete. Essa é a lição que Isabelle, no fim, precisa aprender.
Deixe a Luz do Sol Entrar (Let the Sunshine In, 2017 / França)
Direção: Claire Denis
Roteiro: Christine Angot, Claire Denis
Com: Juliette Binoche, Xavier Beauvois, Philippe Katerine, Gérard Depardieu
Duração: 94 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Deixe a Luz do Sol Entrar
2018-09-20T08:30:00-03:00
Amanda Aouad
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