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Rio Doce

Rio Doce - filme

Durante muito tempo, o cinema brasileiro retratou a periferia como denúncia, seja da pobreza, seja da violência. A classe média também sempre figurou em obras nacionais de maneira polarizada, sendo criticada por sua futilidade ou trabalhando suas questões existenciais. Rio Doce parece trazer um caminho do meio, retratando um encontro entre essas duas classes de maneira honesta e envolvente.

Rio Doce - filme
Tudo gira em torno de Tiago, vivido pelo artista Okado do Canal, um jovem que vive na periferia de Olinda. Apesar de empregado, tem problemas financeiros diversos a ponto de ter a luz de sua residência cortada e uma dor de coluna ainda o impede de praticar seu hobby preferido, o rap de improviso. É quando sua vida se mistura com uma família de classe média do Recife ao descobrir que é filho do patriarca recém-falecido. 

O que mais chama a atenção na obra é a construção de camadas em seu roteiro. O encontro com as três irmãs traz choques, preconceitos, mas a obra não cai na armadilha de criar vilões e mocinhos. Mesmo a irmã mais preconceituosa que não quer o envolvimento do novo irmão com os filhos pequenos e julga pela aparência tem seu momento de aprofundamento quando fala sobre seus últimos momentos com o pai. 

No fundo, temos ali seres humanos com defeitos e qualidades, com possibilidades diante das trajetórias de suas vidas, com reconhecimento de vazios existenciais em contraste com problemas mais urgentes. Mesmo o “white people problem” tão criticado em algumas obras é apresentado como parte dessas facetas, em especial na irmã mais nova. 

Rio Doce - filme
A direção de Fellipe Fernandes ajuda na construção dessa visão menos maniqueísta. A forma como a câmera passeia pelas imagens, pelo caminho, nos coloca em pontos de visões múltiplas, ainda que o protagonismo de Tiago nunca se perca de vista. Não vemos, no entanto, as irmãs, apenas pelos olhos dele. 

Não há também respostas ou soluções imediatas, é recorte, uma continuidade de vidas que somos convidados a observar em pequeno momento. Essa sensação de não ver o todo também nos deixa desconfortáveis para julgar as personagens. É um convite curioso que o diretor nos faz para perceber que no fundo, todos temos nossos próprios problemas e não nos cabe julgar como menores ou mais complexos. Há uma quebra também desse vazio incerto. 

Rio Doce é um nome de um bairro em Olinda, mas carrega também uma possível metáfora para a obra. São vidas que passam, como um rio. E apesar do tom melancólico, há também doçura em seu caminhar. Uma obra sútil, que difere do comumente visto e acaba sendo um belo convite para tratarmos dramas humanos independente de espaços, sem perder o olhar crítico para a realidade.


Filme Visto no 10º Olhar de Cinema de Curitiba.


Rio Doce (Brasil, 2021)
Direção: Fellipe Fernandes
Roteiro: Fellipe Fernandes
Com: Okado do Canal, Cíntia Lima, Cláudia Santos, Carlos Francisco, Nash Laila, Thassia Cavalcanti, Amanda Gabriel
Duração: 90 min.

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