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Entrevista com Toniko Melo

Toniko MeloDiretor de comerciais consagrados, já tendo sido premiado em diversos festivais, Toniko Melo estreia seu primeiro longametragem que em seu primeiro festival já levou quatro prêmios, incluindo de melhor filme no Festival do Rio. Antes de VIPs, Toniko já tinha assinado a série Som e Fúria com seu parceiro de longas datas Fernando Meirelles, e adaptou o formato para um longametragem em 2008. Super simpático e aceitando a brincadeira de compará-lo fisicamente ao ator norte-americano John Malkovich, Toniko Melo conversou comigo quando veio a Salvador para pré-estreia do filme. Confiram o resultado.

Seu primeiro trabalho solo na direção e já ganhou quatro prêmios no Festival do Rio. Como analisa essa sua estréia?
- A gente agora está na mão da distribuição. Vai depender muito dessa guerra. O Brasil, felizmente, tem uma guerra, na minha opinião, positiva que é a disputa por espaço no cinema. É cruel, mas também mostra que tem um vigor. Eu tenho a alegria muito grande de estar participando de alguns festivais aqui no Brasil e fomos selecionados para o festival na África do Sul, que é uma honra. Mas, tivemos que tirar o filme de lá para tentar concorrer em Cannes. Outra coisa que me deixou muito feliz, foi que em fevereiro, o VIPs abriu a comemoração dos cem anos da sociedade psicanalítica brasileira, com uma boa recepção e um debate maravilhoso.

No site, há um espaço com textos sobre psicanálise, uma espécie de embasamento para o perfil do personagem.
- Isso, e agora vai sair ainda mais textos assim. É bem legal. Aí você fala: "você fez um filme para agradar psicólogo e psicanalista?" Não, não fiz. Mas, eu gostaria muito que as pessoas pensassem um pouco, não tem que ter alergia sobre isso. O filme está falando da gente também, por mais Borderline que o personagem do Wagner possa parecer, ele também é cativante, ele também está fazendo uma coisa que todo mundo faz que é estar em busca dele mesmo. A gente não gosta de pensar nisso, de falar nisso, mas é uma verdade. A gente não mente? Não é uma pessoa aqui e ali outra? Mas, tudo em um grau economicamente aceitável.

Mas, esse foco de tentar entender a psicologia do personagem foi de vocês, ou vocês já tinham algum indício?
- Isso é bem ligado ao argumento que eu e o Bráulio (Mantovani) desenvolvemos, mas a gente pensou mais no drama do que em outra coisa. Acontece que eu e o Bráulio temos uma tendência a gostar de personagem com características de personalidade complexa. Por exemplo, adoramos Hamlet. Freud tem uma teoria baseada em cima do Hamlet. Agora, o Shakespeare pensou em psicanálise quando fez o Hamlet? Não, nem existia. Então, é por aí.

Mas, como foi a idéia do filme, você quis fazer essa história ou te convidaram?
- Não, foi assim. Saiu na mídia, o Amaury Jr tinha replicado uma coisa que aconteceu com ele e a Revista Época publicou uma matéria, as pessoas então, falaram comigo que queriam fazer uma sitcom. Eu falei, peraí, tudo pode dar uma sitcom, mas vi algo naquele personagem que ia além. Há três anos eu tinha lido uma frase pichada em um muro que dizia: “Aquilo que nós fazemos de forma não consciente surge depois como destino”. Depois eu fiquei sabendo que era de Jung, mas essa frase bateu em mim e ficou. Quando me contaram a história completa, pelo menos o que a mídia sabia, lembrei na hora dessa frase.

Mas, e o livro de Mariana Caltabiano?
- Não, o livro veio muito depois. Toda a pesquisa fizemos juntos. Inclusive, antes do livro, eu e a Mariana fizemos roteiros para ver se a história ficava em pé. E foi engraçado que o fato da mãe ser uma cabeleireira eu tirei de uma coisa que a Mariana escreveu. Eu gostei e mantive. Porque é uma grande idéia.

O que você pode trazer da experiência de direção de comerciais para filme?
- Ah, isso é difícil de responder, eu não sei. O Fernando (Meirelles) diz que eu tenho mais hora set que o Cacá Diegues, ele fala isso brincando, claro. Mas, de fato tenho. Só que o tipo de filme publicitário que eu faço (ou fazia já que não faço há dois anos) tem só action, texto e humor, difícil ter alguma trama. Só que antes de fazer publicidade eu fazia produção independente. Eu e o Fernando criamos o Ernesto Varela (personagem de Marcelo Tas), fiz sete anos de documentário semanal, especiais nos anos 80 para televisão. Não existia cinema no Brasil, o jeito de manifestar esse querer pelo cinema era com esses vídeos independentes. Tanto é que o Fernando é fruto disso. Nossa trajetória é praticamente idêntica. Trabalhamos sete anos juntos, depois começamos a carreira publicitária, no dia que ele ganhou profissionais do ano, eu ganhei também. A única diferença é que ele dono de produtora e eu estou aqui (risos). Mas, fizemos Som e Fúria juntos e ele é produtor principal de VIPs, foi ele quem trouxe os americanos para o filme.

Toniko Melo
E falando de Som e Fúria, série que acabou sendo transformada em longametragem, como foi a experiência?
- Eu amei. Eu adoro a série original Slings and Arrows do Canadá, sou fã mesmo. E o Fernando tem essas coisas, os amigos dele são Julianne Moore, Steven Spielberg (risos). Aí ele chegou e disse: comprei os direitos de uma série. Eu: ah, foi. Ele: é do Canadá. Eu: do Canadá? que série é essa? E ele: Slings and Arrows. Aí eu quase caio para trás. E ele ainda completa: queria que você fizesse comigo.

E como você analisa a diferença de linguagem de televisão e cinema?
- Não, Som e Fúria não é uma linguagem de televisão. A gente trabalhou com muitos atores televisivos e eles amaram a diferença. Eu adorei fazer.

Mas, se pudesse escolher seu negócio seria fazer cinema?
- Eu, na verdade, não vi muita diferença de fazer o Som e Fúria e o filme VIPs. Porque o padrão não era a Rede Globo, era uma produtora independente, no ritmo da gente, então, não vejo muita diferença. Agora, vocês estão acompanhando as explosões das séries nas TVs americanas. Eu acho que é uma tendência muito forte para gente começar a fazer séries cada vez mais calibradas. Braulio é um que tá louco para emplacar uma série. Então, é um caminho.

Toniko MeloMas, você quer voltar a fazer publicidade?
- Eu preciso. Aliás, por favor. Eles não me dão mais filmes. A publicidade é assim, se você vai pro cinema e se o filme ainda faz sucesso. Pronto. Nada de trabalho. Mas, eu preciso voltar a fazer publicidade.

Você falou que a direção de atores seria seu forte. As atuações no filme são mesmo destaque, vide os prêmios que já ganhou.
- Assim, eu tenho a facilidade em minha opinião: eu sou amigo dos atores. E eu lanço muita gente. VIPs tem muita gente que nunca ficou na frente da câmera. Desde grandes atrizes como a Gisele Fróes, que ganhou prêmio no Rio também, até um câmera da Globo que faz um personagem pela primeira vez na vida. Aliás, a Gisele Fróes nunca tinha feito um filme na vida, o que é uma vergonha pro cinema brasileiro, uma mulher com aquele talento.

Como foi a escolha do elenco? Você pensou no Wagner Moura desde o princípio?
- Graças a Deus, tinha uma série de atores excelentes. O Wagner não havia passado em nossa cabeça ainda, mas como o Braulio trabalhou no Tropa 1 re-roteirizando, fomos na pré-estreia do Tropa 1 e eu conheci o Wagner pessoalmente. Percebi uma coisa que eu estava buscando. O Wagner tem uma capacidade de transmitir o que ele quer pelo olhar que é uma coisa talvez única. Vocês vão ver o que vai acontecer agora com ele nesse filme que ele vai fazer fora do Brasil. Eu falei isso pro Fernando dois anos atrás. Por que eu estou falando isso? Porque tinha o Selton Mello. Quem não quer trabalhar com o Selton Mello? Genial, brilhante. Só que o Wagner tinha essa coisa que era o que eu queria para este personagem que é mais psicológico. Essa coisa do olhar. E são raríssimos atores no mundo que tem essa capacidade. Fora a concentração, né? Imagina que o Wagner está em 95% das cenas desse filme. E na intensidade que ele está.

Uma curiosidade, o personagem do ator Roger Gobeth é um galã de novela ludibriado por Marcelo. Seria o Ricardo Macchi? Houve algum pedido de proteção de imagem e por isso mudou o nome?
- Não, por mim a gente mudava até o nome do Marcelo. Seria uma história independente. Porque pra nós, o nosso Marcelo não é o real. Mas, aí a Universal não quis. Eu e o Wagner queríamos trocar o nome.

Eu perguntei porque o Amaury Jr está lá...
- Ah, mas aí é diferente. O Amaury é o Amaury, a Gol é a Gol, mas se eu não pusesse a Gol, o que eu iria colocar lá? Penalti Air Lines? Tiro de Meta Air Lines? Eu detesto isso. Acho que fica uma coisa brega. Porsche Carrera, queria que eu colocasse o que? Puma? O cara chama Puma? E, na verdade, o cara real se chamava Ferrari, mas a Ferrari não deixou que a gente colocasse o nome Ferrari no bandido, a Porsche deixou.

Toniko MeloE o Amaury aceitou de imediato, foi tranquilo?
- Amaury é genial. Eu falo que, da gênese do VIPs, Amaury é o cara mais importante. Porque se ele não tem aquela atitude muito bem humorada, generosa de contar que ele foi enganado, não existia nada disso.

E os projetos para o futuro? Já tem alguns?
- Tenho, eu comprei os direitos de um livro chamado “A chave de casa”, agora é a história de uma mulher em busca da identidade dela. Uma história real da própria autora, Tatiana Salem Levy. Tem uma peça de Bráulio Pedroso, um projeto meu que estou tentando desenvolver e de um amigo também. Mas, nada fechado. Por enquanto estou desempregado.

Mas, tudo no cinema. É onde está procurando espaço?
- Não, se me mandarem um filme de Coca-Cola eu faço com o maior prazer.


Agradecimentos a João Veríssimo do Salada Cultural pelas fotos principais e Amenar Costa pelas fotos dos bastidores. Todas as fotos você pode ver no nosso Facebook.

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