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Katsuhiro Otomo
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Akira
Akira
Assistir Akira depois de tanto tempo, não deixa de causar aquele choque inicial. O filme abre com uma explosão misteriosa que simboliza não só destruição, mas o fim de uma era. O colapso de Tóquio em 1988 é o estopim que origina Neo‑Tóquio, um lugar cheio de promessas e ruínas. A tensão entre progresso científico e consequências morais é palpável. Katsuhiro Otomo assume tanto a direção quanto o roteiro, e sua marca é visível: cenários microdetalhados, tramas densas e uma narrativa que desafia o espectador a decodificar significados.
Do ponto de vista técnico, a animação continua sendo uma virada tecnológica. Foram milhares de células feitas à mão que criaram uma fluidez incomparável, sobretudo nas cenas de perseguição de moto. Cada traço e sombra revelam cuidado quase obsessivo com ambientação, sendo que a equipe trabalhou a cada frame como se fosse arte estática em movimento. A trilha sonora, com tambores tribais e sintetizadores distópicos, trata o som como arquitetura. Não meramente fundo. Ela é protagonista, amplificando cada momento de ação e tensão.
Nas atuações originais, Mitsuo Iwata (Kaneda) e Nozomu Sasaki (Tetsuo) entregam camadas complexas. Kaneda assume a liderança, mas carrega uma ansiedade fraternal, enquanto Tetsuo transita da vulnerabilidade para o poder absoluto, um arco de transformação que encarna o medo e a fascinação pelo oculto. O embate entre ambos é carregado de urgência emocional, pois há amor e antagonismo na mesma linha de diálogo e imagem.
O diretor Otomo opta por uma narrativa fragmentada, não linear, que em certos momentos faz o espectador se sentir perdido. Uma escolha estilística coerente com o caos urbano e mental que retrata. Essa densidade narrativa, que para muitos é potência, para outros pode ser obscura demais e ainda há momentos que pedem um desvio para compreender motivações, sem que o filme ofereça respiro nem explicações amplas. Essa falta de clareza, porém, é parte da experiência.
Um dos momentos mais marcantes é a ascensão de Tetsuo, em que ele se distorce fisicamente, exibindo um horror corporal que supera o psicológico e atinge o físico. É o corpo humano rebelando-se contra o confinamento social, um corpo que grita poder, medo e desespero. Uma sequência visceral que traz o tema da identidade em choque com tecnologia e política.
Entre os pontos fortes, não tem como não destacar o equilíbrio entre ritmo intenso e profundidade simbólica, construção visual e sonora, além da capacidade de manter a atualidade décadas depois como alegoria social. Acredito que o excesso de personagens secundários e subtramas abre espaço para distração e poderíamos ter menos "ruído" narrativo, com mais foco na relação central e nos dilemas do trio protagonista.
Em resumo, Akira é mais do que um filme; é um fenômeno estético que combina cyberpunk, horror e crítica social num pacote que desafia quem acompanha. Otomo reescreve o futuro com traços explosivos, som ritual e corpo em mutação, questionando a busca desenfreada por poder. A proposta é ampla, perturbadora e ainda necessária hoje.
Akira (Akira, 1988 / Japão)
Direção: Katsuhiro Otomo
Roteiro: Katsuhiro Otomo
Com: Mitsuo Iwata, Nozomu Sasaki, Mami Koyama
Duração: 124 min.

Ari Cabral
Bacharel em Publicidade e Propaganda, profissional desde 2000, especialista em tratamento de imagem e direção de arte. Com experiência também em redes sociais, edição de vídeo e animação, fez ainda um curso de crítica cinematográfica ministrado por Pablo Villaça. Cinéfilo, aprendeu a ser notívago assistindo TV de madrugada, o único espaço para filmes legendados na TV aberta.
Akira
2025-08-06T08:30:00-03:00
Ari Cabral
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