Não acredito que possamos chamar o média metragem de uma obra de arte por sua técnica, afinal, está ali um único enquadramento e personagens se revezando com graus de estranhamento diversos, ao ponto de um telefone tocar no meio do depoimento de Goupil.
O grande mérito do filme, repito, é seu elenco. Estão ali diretores de diversos estilos e compreensões sobre seu processo de trabalho e é interessante vê-los diante das câmeras de uma forma totalmente inusitada, com liberdade para serem sinceros por dez minutos (tempo de um rolo de filme 16mm). A exceção de Godard, todos ligam e desligam as câmeras e estão livres para expor suas idéias a cerca deste tema, tão em voga na época e até hoje atual.
Uma grande sacada de Wenders foi colocar ao lado da poltrona onde o entrevistado sentaria, uma televisão (o oponente temido) que a cada entrevista mostrava alguma imagem banal (jogo, programa de auditório, desenho animado, série japonesa de monstro, entre outros), em uma clara crítica ao meio. Interessante ressaltar que apenas Werner Herzog tem a ação de desligá-la, enquanto muitos simplesmente a criticam.
Godard chega a brincar que Wenders o chamou ali para assistir a um jogo de tênis (imagem que está na televisão no momento de sua fala) e que ele fará esse papel de bola (que ele considera tolo). Ele, chega a filosofar em vários momentos de sua fala (que marca com um cronômetro), chegando a dizer que Wenders o colocou diante das câmeras, mas sua mente está atrás dela.
O único entrevistado ausente é Yilmar Guney (na época, fugitivo da polícia), sua voz é mostrada em um gravador pelo próprio Wenders e sua foto colocada em cima da tela da televisão. É o único momento em que o enquadramento muda, primeiro focando o gravador em um contra-plano, depois fechado na televisão para mostrar a foto de Guney.
O fato é que estes cineastas de renome se expõem, discordam ou endossam a preocupação de Wenders, alguns curtos e grossos como Paul Morrisey que acredita no fim do cinema, outros otimistas como Antonioni que acha que iremos nos adaptar sem perceber. Há ainda os práticos, como Spielberg, único representante da indústria Hollywoodiana, que parece até mesmo feliz com as mudanças (sua grande preocupação é com dólares e a inflação). Ou nossa representante, Ana Carolina, que diz não se interessar por cinema eletrônico, por não considerá-lo arte. E é isso que torna “Quarto 666” interessante e até mesmo necessário de ser visto. Afinal, é a visão do cinema sobre sua própria sorte, em uma época em que a tecnologia ainda estava engatinhando. Que ninguém o procure esperando um filme, em sua visão artística com roteiro, direção e montagem. Há ali uma proposta clara de debate e o inusitado da forma é que o torna mais verdadeiro.
Pra terminar, uma entrevista interessante que encontrei no Youtube com o diretor, já que no filme ele apenas convida os outros a falarem: