Passageiros
Não costumo começar um post com o trailer, mas foi a melhor maneira que consegui para iniciar uma análise do filme Passageiros. Acredito que existam quatro filmes diferentes dentro de um mesmo. O filme do argumento, que é muito bom, não totalmente original, mas sob um prisma que poderia ser mais profundo que os demais do gênero (quem não viu o filme, não clique no link, pode dar pistas do final). O filme do trailer, que é bastante interessante e bem construído, com doses sobrenaturais em um bom suspense. O filme do roteiro que mostra como escolhas erradas podem destruir um bom argumento. E o filme propriamente dito, que além dos problemas de roteiro, tem uma uma trilha sonora das mais clichês possíveis e uma direção que se esforça um pouco, mas não surpreende.
Então, por que o filme vale a pena? Porque apesar do esforço do roteiro, o argumento ainda é muito bom e faz o espectador pensar, brincar de detetive e se surpreender, mesmo que a surpresa seja previsível no decorrer da trama.
O elenco também vale a pena, Anne Hathaway, Patrick Wilson, Dianne Wiest, Clea DuVall e Andre Braugher são grandes atores que já demonstraram seu valor em excelentes filmes. Principalmente a protagonista Anne Hathaway, que concorreu ao Oscar recentemente e vem tendo uma carreira em ascenção em Hollywood. Mesmo assim, não esperem grandes interpretações, estão todos apenas normais, sem destaques.
Nos concentrando, então, nos dois problemas básicos: Roteiro e Direção. Um bom argumento é um ponta-pé inicial para um bom filme, mas ele é apenas um começo. Cabe ao roteirista traçar uma estratégia de narração fílmica condizente com a expectativa do mesmo, sem pontas soltas ou Deus ex Machina. Um filme de suspense é ainda mais delicado, pois você tem que surpreender com coerência. O grande problema de Passageiros, no entanto, não está no suspense, mas na escolha de ficar em cima do muro. Tem drama, tem suspense, tem romance, tem terror tudo misturado sem uma definição de para que serve o filme. Um filme precisa definir o gênero, porque senão fica sem parâmetro, tratando de tudo de forma superficial e sem um conjunto de efeitos que atinja o espectador. Ronnie Christensen desenvolveu o roteiro de maneira solta, não dosando as pistas e construindo a curva dramática para uma resolução sem sentido. Não falo aqui do "mistério" do filme, esse já está no argumento e é bem interessante, falo do que Christensen fez depois, com cenas totalmente desnecessárias que dão um banho de água fria após a confirmação do que houve. De suspense virou comédia romântica, por assim dizer, com um pequeno drama final.
Falando especificadamente na direção, o colombiano Rodrigo Garcia sempre pareceu um promissor cineasta. Não por ser filho de Gabriel García Márquez, mas por sua trajetória em Hollywood começando como operador de câmera, passando a diretor de fotografia, para finalmente diretor. Seria de esperar que em seu primeiro trabalho de grande visibilidade ele se superasse investindo em inovações e tentando melhorar o clima criado pelo roteiro. Porém, o que se vê não traz nenhuma novidade. Planos comuns, sequências frias onde deveria haver emoção, falta de clima nas revelações e dramas dos personagens que levaram a atuações caricaturais, por vezes. Uma pena, pois pelo talento do diretor e argumento, Passageiros poderia ser um grande filme.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Passageiros
2009-04-03T12:51:00-03:00
Amanda Aouad
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