Grandes Cenas: O Senhor dos Anéis
Sempre falo aqui de cenas clássicas que marcaram a história do cinema, pesquisando para escolher a próxima a ser analisada me deparei com uma das maiores provas de amizade da nossa cinematografia recente. Sam e Frodo. Muitos fizeram piadinhas tolas em relação a sexualidade de ambos, mas quem leu o livro ou mesmo viu o filme com atenção não pode deixar de se emocionar com o devotamento abnegado de Sam a seu amigo, chefe e ídolo. Para Sam, o Senhor Frodo está acima do bem e do mal, acima de Rosinha ou mesmo do próprio hobbit. A forma como ele segue o personagem em sua trajetória trágica, como um anjo guardião, única testemunha de seu fardo, é linda. E essa cena é a tradução máxima desse sacrifício. Uma cena tão marcante que inspirou um brinquedo da franquia.
É até difícil explicá-la. Sam e Frodo estão no meio da Montanha da Perdição, em Mordor. Frodo está esgotado, totalmente tomado por Sauron. Sam o incentiva a continuar, falta pouco agora. Sam coloca Frodo no colo, o hobbit está desmaiado. Venta forte, a fotografia quase em tom sépia mostra a falta de vida no local, a música apoteótica completa o quadro. Sam contempla a entrada da caverna. Está cansado também. A câmera fecha em seu rosto e passa a acompanhar a conversa em plano e contra-plano fechado, focando nas expressões de ambos.
Sam começa a lembrar do Condado, falar das coisas boas que poderiam estar vivendo. Seu rosto se ilumina com essas lembranças. Frodo diz que não se lembra de nada, sua mente agora é apenas escuridão. Interessante ver que Frodo é visto em plongée, ou seja com a câmera de cima para baixo e Sam em contra-plongée, de baixo para cima. Esse enquadramento muito utilizado pelo expressionismo alemão, funciona como sensação de poder. Visto de cima para baixo, Frodo fica inferior, frágil, enquanto Sam fica potente, superior. O chefe está nas mãos do empregado, mas Sam é tão puro e abnegado que continua o chamando de Sr. Frodo.
É quando Sam toma a decisão máxima. Eles precisam acabar com aquilo. Mas, se Frodo não tem forças para continuar e Sam não pode levar o anel por ele, há outra forma. É quando ele diz: "Eu não posso carregá-lo por você, mas posso carregar você". É lindo perceber que o filme não cria aí um super-herói. Sam carrega Frodo de forma desajeitada, quase sem forças. A música sobe, o plano não fica completamente aberto, mas dá para ver os dois de corpo inteiro e os passos de Sam. Logo retornamos ao close do hobbit, sua dificuldade, sua obstinação. Ele precisa chegar lá. O resto, quem viu o filme ou leu o livro sabe bem como termina.
Infelizmente não encontrei essa cena para colocar diretamente aqui. Apenas o link com a incorporação proibida. Vejam.
Como está em inglês sem legendas aqui a tradução do diálogo completo:
Sam: Lembra-se do condado, Sr. Frodo? Logo chegará a primavera e os pomares florescerão. Os pássaros farão seus ninhos na aveleira e semearão a cevada de verão nos campos baixos. E comerão os primeiros morangos com creme. Lembra-se do gosto do morango?
Frodo: Não, Sam. Não consigo me lembrar do gosto da comida, nem do som da água, nem da sensação de tocar a grama. Estou despido nas trevas. Não há nada. Nenhum véu entre mim e a roda de fogo. Posso vê-lo nitidamente.
Sam: Então, vamos nos livrar dele de uma vez por todas. Vamos, Sr. Frodo. Não posso carregá-lo pelo senhor, mas posso carregar o senhor! Vamos.
É até difícil explicá-la. Sam e Frodo estão no meio da Montanha da Perdição, em Mordor. Frodo está esgotado, totalmente tomado por Sauron. Sam o incentiva a continuar, falta pouco agora. Sam coloca Frodo no colo, o hobbit está desmaiado. Venta forte, a fotografia quase em tom sépia mostra a falta de vida no local, a música apoteótica completa o quadro. Sam contempla a entrada da caverna. Está cansado também. A câmera fecha em seu rosto e passa a acompanhar a conversa em plano e contra-plano fechado, focando nas expressões de ambos.
Sam começa a lembrar do Condado, falar das coisas boas que poderiam estar vivendo. Seu rosto se ilumina com essas lembranças. Frodo diz que não se lembra de nada, sua mente agora é apenas escuridão. Interessante ver que Frodo é visto em plongée, ou seja com a câmera de cima para baixo e Sam em contra-plongée, de baixo para cima. Esse enquadramento muito utilizado pelo expressionismo alemão, funciona como sensação de poder. Visto de cima para baixo, Frodo fica inferior, frágil, enquanto Sam fica potente, superior. O chefe está nas mãos do empregado, mas Sam é tão puro e abnegado que continua o chamando de Sr. Frodo.
É quando Sam toma a decisão máxima. Eles precisam acabar com aquilo. Mas, se Frodo não tem forças para continuar e Sam não pode levar o anel por ele, há outra forma. É quando ele diz: "Eu não posso carregá-lo por você, mas posso carregar você". É lindo perceber que o filme não cria aí um super-herói. Sam carrega Frodo de forma desajeitada, quase sem forças. A música sobe, o plano não fica completamente aberto, mas dá para ver os dois de corpo inteiro e os passos de Sam. Logo retornamos ao close do hobbit, sua dificuldade, sua obstinação. Ele precisa chegar lá. O resto, quem viu o filme ou leu o livro sabe bem como termina.
Infelizmente não encontrei essa cena para colocar diretamente aqui. Apenas o link com a incorporação proibida. Vejam.
Como está em inglês sem legendas aqui a tradução do diálogo completo:
Sam: Lembra-se do condado, Sr. Frodo? Logo chegará a primavera e os pomares florescerão. Os pássaros farão seus ninhos na aveleira e semearão a cevada de verão nos campos baixos. E comerão os primeiros morangos com creme. Lembra-se do gosto do morango?
Frodo: Não, Sam. Não consigo me lembrar do gosto da comida, nem do som da água, nem da sensação de tocar a grama. Estou despido nas trevas. Não há nada. Nenhum véu entre mim e a roda de fogo. Posso vê-lo nitidamente.
Sam: Então, vamos nos livrar dele de uma vez por todas. Vamos, Sr. Frodo. Não posso carregá-lo pelo senhor, mas posso carregar o senhor! Vamos.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Grandes Cenas: O Senhor dos Anéis
2010-11-07T14:31:00-03:00
Amanda Aouad
aventura|drama|Elijah Wood|grandes cenas|Sean Astin|
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