A Outra Terra
Em 1969, Robert Parrish lançou Doppelgänger, um filme onde é descoberto um planeta igual à Terra, em uma posição paralela ao sol. Alguns podem dizer que A Outra Terra é inspirada nisso. Porém, na realidade o filme de Mike Cahill está tão distante quando o tal planeta azul que começa a ser visto em nossa órbita.
A Outra Terra usa apenas o argumento do espelho para falar de escolhas, de novas chances e realidades paralelas. Afinal, o que é a Terra 2, como começam a chamar os terráqueos, que surge e se aproxima a cada dia de nosso planeta? Ou será que nós é quem somos o duplo do outro lado do espelho? Na realidade, Mike Cahill e o roteirista Brit Marling, usam metáforas científicas para ir em busca da complexa relação humana, seus sentimentos e o desejo de ter uma segunda chance.
Assim está nossa protagonista, Rhoda Williams. Uma estudante de astrofísica com um futuro pela frente que se distrai com o ponto azul no céu e causa um acidente que a marca profundamente. Ela mata uma mulher grávida, uma criança e deixa o pai daquela família em coma por dois anos. Vai para a cadeia e se perde em suas culpas e na vontade impossível de apagar o passado. Tanto que aceita como função a de servente de um colégio, uma espécie de terapia onde não precisa lidar com gente.
Mas, ao mesmo tempo em que quer se afundar em seus sentimentos, em seu quarto vazio ou na cabine de um banheiro sujo onde esgota suas forças para não precisar pensar, Rhoda é impelida a procurar o músico John Burroughs e pedir perdão. Ele não tem ideia de quem ela seja, mas vive em um processo autodestrutivo em depressão profunda pela perda da família. O encontro dos dois é quase um encontro de almas despedaçadas, que ajudam uma a outra a reunir os cacos em uma tentativa pálida de sobreviver.
E é belo. Cada gesto, cada tentativa. Ambos não pertencem mais àquele mundo. Ela por sair da prisão após quatro anos como se tivesse sobrevivido a um furacão que passou em sua vida. Ele, ainda devastado após acordar depois de dois anos descobrindo que não tem mais mulher nem filho. É interessante que a desculpa da faxina os reúna. Uma faxina é o que ambos precisam, mas uma faxina interna e não de aparências. Algo que mexa em suas estruturas e consiga rearrumar a casa. Se é que isso é possível.
E nisso, entra o outro planeta. O duplo terrestre que cresce poeticamente a olhos nus. O que era antes apenas um ponto azul distante começa a tomar forma. E os primeiros contatos demonstram que não é apenas um reflexo físico. Existem pessoas ali, pessoas que são nossos próprios duplos, mas que possuem pequenas mudanças possíveis. De fato, uma realidade alternativa de nós mesmos, ou não. Apenas uma cópia espelhada, com pequenas mudanças. Quem há de saber? Apenas aqueles privilegiados que conseguirem uma passagem na nave que irá embarcar em breve em uma exploração.
Rhoda não tem nada a perder e há a chance de recomeçar em outro planeta, ou mesmo apenas olhar como seu outro eu está vivendo. A carta que escreve é bem coerente e condizente com a nossa própria história. Em nosso medo em relação ao desconhecido, estamos sempre fantasiando o que vamos encontrar além do horizonte, sejam em grandes navegações do século XV, ou conquistas especiais recentes. Tudo isso está implícito e explícito em A Outra Terra.
Destaque em toda essa poesia para Brit Marling e William Mapother, que como Rhoda e John Burroughs, seguram o filme durante toda a projeção. Seus medos, suas emoções, suas escolhas nos levam juntos naquela aventura interior. Com uma capa de ficção científica, A Outra Terra é um drama humano intenso, belo e marcante. Principalmente pelos perturbadores segundos finais que nos fazem pensar e imaginar as infinitas possibilidades que a vida nos dá.
A Outra Terra (Another Earth, 2012 / EUA)
Direção: Mike Cahill
Roteiro: Brit Marling e Mike Cahill
Com: Brit Marling, William Mapother e Matthew-Lee Erlbach
Duração: 92 min.
A Outra Terra usa apenas o argumento do espelho para falar de escolhas, de novas chances e realidades paralelas. Afinal, o que é a Terra 2, como começam a chamar os terráqueos, que surge e se aproxima a cada dia de nosso planeta? Ou será que nós é quem somos o duplo do outro lado do espelho? Na realidade, Mike Cahill e o roteirista Brit Marling, usam metáforas científicas para ir em busca da complexa relação humana, seus sentimentos e o desejo de ter uma segunda chance.
Assim está nossa protagonista, Rhoda Williams. Uma estudante de astrofísica com um futuro pela frente que se distrai com o ponto azul no céu e causa um acidente que a marca profundamente. Ela mata uma mulher grávida, uma criança e deixa o pai daquela família em coma por dois anos. Vai para a cadeia e se perde em suas culpas e na vontade impossível de apagar o passado. Tanto que aceita como função a de servente de um colégio, uma espécie de terapia onde não precisa lidar com gente.
Mas, ao mesmo tempo em que quer se afundar em seus sentimentos, em seu quarto vazio ou na cabine de um banheiro sujo onde esgota suas forças para não precisar pensar, Rhoda é impelida a procurar o músico John Burroughs e pedir perdão. Ele não tem ideia de quem ela seja, mas vive em um processo autodestrutivo em depressão profunda pela perda da família. O encontro dos dois é quase um encontro de almas despedaçadas, que ajudam uma a outra a reunir os cacos em uma tentativa pálida de sobreviver.
E é belo. Cada gesto, cada tentativa. Ambos não pertencem mais àquele mundo. Ela por sair da prisão após quatro anos como se tivesse sobrevivido a um furacão que passou em sua vida. Ele, ainda devastado após acordar depois de dois anos descobrindo que não tem mais mulher nem filho. É interessante que a desculpa da faxina os reúna. Uma faxina é o que ambos precisam, mas uma faxina interna e não de aparências. Algo que mexa em suas estruturas e consiga rearrumar a casa. Se é que isso é possível.
E nisso, entra o outro planeta. O duplo terrestre que cresce poeticamente a olhos nus. O que era antes apenas um ponto azul distante começa a tomar forma. E os primeiros contatos demonstram que não é apenas um reflexo físico. Existem pessoas ali, pessoas que são nossos próprios duplos, mas que possuem pequenas mudanças possíveis. De fato, uma realidade alternativa de nós mesmos, ou não. Apenas uma cópia espelhada, com pequenas mudanças. Quem há de saber? Apenas aqueles privilegiados que conseguirem uma passagem na nave que irá embarcar em breve em uma exploração.
Rhoda não tem nada a perder e há a chance de recomeçar em outro planeta, ou mesmo apenas olhar como seu outro eu está vivendo. A carta que escreve é bem coerente e condizente com a nossa própria história. Em nosso medo em relação ao desconhecido, estamos sempre fantasiando o que vamos encontrar além do horizonte, sejam em grandes navegações do século XV, ou conquistas especiais recentes. Tudo isso está implícito e explícito em A Outra Terra.
Destaque em toda essa poesia para Brit Marling e William Mapother, que como Rhoda e John Burroughs, seguram o filme durante toda a projeção. Seus medos, suas emoções, suas escolhas nos levam juntos naquela aventura interior. Com uma capa de ficção científica, A Outra Terra é um drama humano intenso, belo e marcante. Principalmente pelos perturbadores segundos finais que nos fazem pensar e imaginar as infinitas possibilidades que a vida nos dá.
A Outra Terra (Another Earth, 2012 / EUA)
Direção: Mike Cahill
Roteiro: Brit Marling e Mike Cahill
Com: Brit Marling, William Mapother e Matthew-Lee Erlbach
Duração: 92 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
A Outra Terra
2012-11-21T08:30:00-03:00
Amanda Aouad
Brit Marling|critica|drama|Mike Cahill|William Mapother|
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