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Palavra (En)cantada

Palavra (En)cantadaMúsica e poesia. Sua relação e a forma como elas caminham juntas na cultura popular brasileira. Essa é a investigação principal do documentário de Helena Solberg, Palavra (En)cantada.

Não há na obra nenhuma necessidade de comprovar se poesia e letra de música estão ou não no mesmo patamar de qualidade artística. Como diz uma das entrevistadas, Adriana Calcanhotto, "a vida é muito curta, não tenho tempo para essas questões". Aliás, todos os depoentes são de peso, como a própria cantora e compositora, Antônio Cícero, Arnaldo Antunes, BNegão, Chico Buarque, Ferréz, Jorge Mautner, José Celso Martinez Correa, José Miguel Wisnik, Lirinha (Cordel do Fogo Encantado), Lenine, Luiz Tatit, Maria Bethânia, Martinho da Vila, Paulo César Pinheiro, Tom Zé e Zélia Duncan.

Palavra (En)cantadaE vem de Ferréz uma das questões mais interessantes do filme quando diz que "literatura tem que ser compartilhada como pão". Para ele, não deveria ser essa uma matéria de cultos, para poucos, afinal o conhecimento necessário de nossa língua e nossas obras é que nos fazem progredir enquanto seres humanos. Mas, como diz outro entrevistado, a cultura brasileira sempre foi muito mais oral que escrita, e nesse ponto que as canções entram com tanta força.

Tivemos a felicidade de termos compositores que se dedicaram a letras tão ricas e capazes de análises tão profundas quanto qualquer poesia. E até mesmo poetas que passaram a se dedicar à música como Vinícius de Moraes. Sendo assim, a popularização da MPB acabou ajudando na popularização da própria literatura. Bethânia mesmo dá o exemplo que ela começou a adotar nos shows de sempre declamar uma poesia para puxar as músicas, o que não é tão original, vide o próprio Vinícius que já compunha letra e versos mesclados vide Samba da Benção ("senão é como amar uma mulher só linda, e daí?"), ou mesmo Eu sei que vou te amor ("De tudo, ao meu amor seria atento antes...").

Palavra (En)cantadaO roteiro de Palavra (En)cantada constrói uma cadência interessante, indo resgatar a origem das canções, a tradição dos trovadores, as investidas da MPB, a Bossa Nova, o Tropicalismo, o Rap, o Hip Hop, discutindo inclusive, se as canções ainda tem espaço ou não no cenário cultural atual. Temos a citação de exemplos também como Cartola, que viveu no Morro, sem uma educação culta, mas criou obras impressionantes. Ou Zeca Baleiro que foi em busca da poetisa Hilda Hilst para musicar suas obras, criando um trabalho tão belo e endeusado por Zélia Duncan.

O filme traz na montagem ainda algumas brincadeiras e misturas de material de arquivo com entrevistas exclusivas. Temos partes do Festival de 68 com Caetano Veloso apresentando Alegria, Alegria e dando entrevistas para o canal da época. Os Mutantes em clipes diversos. Tom Zé fazendo dobradinha consigo mesmo em diversos momentos. E alguns clipes de Hip Hop, no momento mais atual do documentário, que ganha até um ritmo diferente com depoimentos em externas e até com o entrevistado andando pelas ruas. O que condiz com o assunto.

Palavra (En)cantadaComo curiosidade, temos o depoimento de Chico Buarque falando que João Cabral de Melo Neto não gostava de música e não tinha autorizado a versão musical de Morte e Vida Severina. Mas, como ele, na época um garoto, não sabia, aceitou o desafio. Como o musical fez sucesso no mundo inteiro, João Cabral acabou acolhendo a obra. É com Chico também outro momento polêmico, quando um outro entrevistado fala da força das letras das canções brasileiras e pergunta: quem vai dizer que Chico Buarque não é um poeta? Aí, Helena Solberg corta para o próprio Chico dizendo que não é, nem quer ser um poeta, pois suas letras só seguem a melodia já existem. As palavras só estão ali para acompanhá-la.

Polêmicas e brincadeiras à parte, Palavra (En)cantada é um documentário gostoso de acompanhar e fácil de nos fazer pensar. Valorizando a nossa cultura, a nossa música e a capacidade artística de nosso povo. É também um alerta para a necessidade de se passar conhecimento, independente do meio. Sem preconceitos é possível atingir de maneira mais eficaz os alunos que continuam por aí explanando que odeiam português e literatura é uma coisa chata.



Palavra (En)cantada (Palavra (En)cantada, 2008 / Brasil)
Direção: Helena Solberg
Roteiro: Diana Vasconcellos, Helena Solberg, Marcio Debellian
Duração: 86 min

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