
A escolha da abertura do filme é bastante feliz. Começamos com uma dose de ironia ao mostrar as manifestações das Diretas Já de 1984 com a voz em off do humorista Chacrinha dizendo "Terezinha, uuu, Diretas Já". Mostra um pouco do folclore que se tornou a nossa principal luta democrática.
Abrindo e fechando o documentário, a narração da própria Paula nos explica o recorte do filme. Ela nos dá a dimensão daquele momento, após vinte anos de ditadura e dezesseis de AI-5, onde seu avô sempre esteve presente, lutando pelos direitos humanos acima de tudo. Heráclito Fontoura Sobral Pinto se definia como um cristão, que odiava o pecado, mas amava o pecador. E dessa maneira ele regeu a sua vida e interveio na história do nosso país. Não apenas durante a ditadura militar, mas desde a Ditadura Vargas, quando foi designado a defender o comunista Luis Carlos Prestes.

Em determinado momento do documentário, a equipe passa por um camelô e o entrevista do diz: "ele também era da época de Sobral". A equipe se volta para o camelô que dispara a falar sobre o Sr. Sobral Pinto, "maior jurista desse país". E descreve feitos importantes dele com uma desenvoltura impressionante.
É interessante como Paula Fiuza vai costurando o filme com o material que tem. Para falar dos acontecimentos na Ditadura Vargas, por exemplo, ela parte de uma matéria da televisão que interroga Luis Carlos Prestes sobre Sobral. Ele fala e a partir daí temos o depoimento da filha do líder comunista com Olga, que teve a vida salva pelo jurista. Foi Sobral que conseguiu agilizar um documento que comprovava a paternidade de Prestes, que não era casado com Olga, tirando assim, a bebê das mãos dos nazistas.

Sua inteligência e habilidade em encontrar brechas nas leis das ditaduras em prol dos direitos humanos também pode ser percebida durante a vigência do AI-5, quando não era permitido emitir habeas corpus para presos políticos, mas ele conseguia utilizar de manobras para conseguir que o documento, no mínimo, localizasse esse preso.
Paula Fiuza não poupa nem mesmo a família em sua busca pela reconstituição da memória do avô. No documentário não fica claro se é mãe ou tia da diretora, mas uma das filhas de Sobral faz diversos depoimentos emocionados, incluindo um de extrema emoção, onde chora ao reler uma carta. Outro neto, também jornalista, fala um pouco de sua experiência entrevistando o avô sobre um fato ocorrido logo após o decreto do AI-5, quando Sobral foi preso por medo dos militares de que ele pudesse insuflar a massa contra a lei.

O documentário dedica ainda uma boa parte do tempo a outro deslize de Sobral, na década de 20 que o corroeu a alma até o fim da vida. É interessante ver como o tema é conduzido, sendo a diretora da família, entrevistando outros familiares sobre isso.
Sobral – O homem que não tinha preço é um documentário que faz jus à memória desse homem que passou a vida defendendo os direitos humanos, sempre com muito humor. Tanto que virou tema de uma música de João Nogueira chamado Vovô Sobral. Ainda que a linguagem do documentário não traga nada de novo, é de uma importância histórica imensa para o nosso país.
Sobral – O Homem Que Não Tinha Preço (2013 / Brasil)
Direção: Paula Fiuza
Roteiro: Paula Fiuza
Duração: 84 min.