
Estamos em um mundo alternativo onde uma lei resolveu a questão da violência nos Estados Unidos. Durante uma noite no ano, as pessoas tem o direito a fazer o que quiserem sem consequências legais. Todos os órgãos do Governo estão indisponíveis, seja polícia, bombeiros, guarda florestal, guarda de trânsito. Mesmo os hospitais. Dessa maneira, acreditam, que se possa haver paz nos outros 364 dias do ano.
Com essa premissa nos vemos questionados sobre a própria natureza humana ao título original do filme: The Purge. Podemos expurgar nossos pecados, pecando tudo o que pudermos em uma única noite? E as consequências psicológicas disso? Diante dessa realidade estranha, o personagem de Max Burkholder, o caçula da família Sandin acaba sendo a voz da razão. O problema é a plateia se voltar contra ele, como se ele fosse o mais errado de todos.

É nesse ponto que acredito que as plateias se dividam em opinião de acordo com o ponto de vista observado. James DeMonaco busca nos dar elementos para reflexão, não apenas daquela situação hipotética, mas da questão da violência em si no mundo em que vivemos. Lembrei muito da frase da música da banda O Rappa, "as grades do condomínio são pra trazer proteção, mas também trazem a dúvida se é você quem está nessa prisão". Fechar os olhos para a violência urbana, no conforto do nosso lar é a solução? Estamos mesmo vivendo em um mundo de caos, onde o outro pouco importa?

O roteiro, então, nos leva nessa reflexão. Nesse ponto de vista que grita diante de uma rotina já estabelecida. E por isso não acredito em incongruência dos personagens. Todas as consequências para aquela família partem desse clamor inicial, que poderá convencer alguns, chamando-os à razão no momento-chave de cada processo. Assim como é perfeitamente perceptível as atitudes da gangue de jovens que cercam a casa, em um estilo que tentam imitar a gangue de Laranja Mecânica. E também dos vizinhos dos Sandin, que nos dão inclusive pistas do que pode acontecer, no início do filme, em diálogos triviais. O único personagem completamente perdido no roteiro é o namorado da filha mais velha da família.

A exposição excessiva das regras também nos parecem um erro, há uma explicação textual antes do início, o anúncio oficial do início da noite na televisão, além de diversas reportagens que trazem inclusive questionamentos de pessoas contra a lei, falando que é uma forma de eliminar pessoas pobres e incapazes. Uma forma de garantir que a discussão aconteça na mente das pessoas. Porém, poderia ser construída de uma maneira mais sutil, de fato.
No final, Uma Noite de Crime é um filme que vai além do filme. O roteiro nos dá elementos para uma discussão profunda sobre nossas próprias atitudes e de nossa sociedade. Um filme para pensar.
Uma Noite de Crime (The Purge, 2013 / EUA)
Direção: James DeMonaco
Roteiro: James DeMonaco
Com: Ethan Hawke, Lena Headey, Max Burkholder, Adelaide Kane, Edwin Hodge e Rhys Wakefield
Duração: 90 min.