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Hilton Lacerda
Irandhir Santos
Jesuita Barbosa
Rodrigo García
Sílvio Restiffe
Sylvia Prado
Tatuagem
Tatuagem
Roteirista de filmes como Baile Perfumado, Amarelo Manga, Baixio das Bestas, A Festa da Menina Morta e A Febre do Rato, Hilton Lacerda assume a direção do seu primeiro longametragem de ficção, conseguindo nos envolver e emocionar.
A trama se passa em Recife durante o período da ditadura militar. O foco, um amor proibido entre o artista Clécio e o soldado Arlindo, mais conhecido como Fininha por causa de sua voz. Uma relação homossexual, entre um transgressor libertário e um militar opressor em um mundo de ideias. E o mais interessante de Tatuagem é nos contar essa história sem exageros panfletários.
O início do filme é construído em paralelo, nos mostrando a rotina dos dois. Clécio é o líder do grupo teatral Chão de Estrelas, com seus espetáculos transgressores que tem em Paulete a maior estrela. O transformista é também um caso de Clécio, e tem uma personalidade forte, que sempre busca provocar o que está ao seu redor. O estilo hippie do grupo, sempre em um clima transgressor, tendo um militar no meio, nos remete ao clima da peça / filme Hair, apesar de terem outras questões envolvidas.
A construção inicial de Fininha é bastante simbólica e diferente do personagem Bukowski da referida história americana. A cena inicial é ele sentado em sua cama no quartel e as grades das demais camas na perspectiva que a câmera nos mostra, se assemelha a grades de uma prisão. Há sempre esse clima quando vemos o exército, algo que nos remete aos versos de Vandré "no quartel lhes ensinam antiga lição, de morrer pela pátria e viver sem razão".
E é curioso que Hilton Lacerda queria nos mostrar esse Fininha assim, preso em um mundo sem sentido, mas ao mesmo tempo não fazê-lo ingênuo. Ainda que a belíssima cena de Clécio cantando no palco "Esse Cara" nos remeta a um jogo de sedução ao menino que ali está, tudo é muito mais profundo, a começar pela letra da música. Não há na relação uma divisão clara de papéis, de sedutor e seduzido, de dominador e dominado. Eles estão o tempo todo se misturando e invertendo papéis. Principalmente, quando Fininha começa a questionar a própria filosofia de Clécio ao dizer que ele não pode ter ciúmes, nem posses.
Toda a construção da relação do casal, e das relações humanas em geral que são expostas no filme é feita de uma maneira bastante sensível. Não há julgamentos nem em relação às pessoas que estão no quartel. Todos são vistos como seres humanos, todos frágeis e capazes de serem fortes. Parece que Hilton Lacerda não quer polemizar ou mesmo aprofundar temas, apenas contar uma experiência de vida de uma forma leve. Mesmo a repressão militar do período ditatorial é citado superficialmente.
E nada disso é ruim, é uma escolha. Não cabe a Tatuagem ser intenso seja emocionalmente, ou em denúncia. Quer apenas nos passar uma sensação do momento, da própria busca pela liberdade e pela força de transgredir os limites através da arte. Talvez por isso, as imagens em Super-8 casem tão bem na mistura fotográfica da obra. Elas, por si só, nos remetem a uma nostalgia de um tempo que não volta. Vivenciamos melhor o clima do Chão de Estrelas e sua eterna festa.
E o maestro de tudo isso é Clécio, ou melhor, o ator Irandhir Santos que nos passa toda a verdade de seu personagem e sua necessidade de reconstruir-se a partir da arte. Um ator que demonstra, cada vez mais, talento para brincar em nos passar sua verdade e a verdade do personagem, sem se repetir. É interessante perceber, por exemplo, o que tem de semelhante e diferente entre Clécio e Zizo. Dois artistas de Recife, que chamam a atenção através da transgressão, onde o sexo também é uma busca natural diante do tabu imposto pela sociedade. Mas, ao mesmo tempo, duas pessoas completamente diferentes, não apenas no exterior óbvio, mas na alma. Clécio não tem a angústia de Zizo, ainda que sua alma se inquiete diante da realidade à sua volta. E Irandhir sabe nos passar muito bem essas diferenças.
Tatuagem é um filme poético e belo. Uma fábula delicada sobre o amor, a liberdade e os direitos de cada um que apesar de se situar em um período específico de nossa história, se torna universal e atemporal. Recife nos brinda a cada dia com um cinema que realmente empolga.
Tatuagem (Tatuagem, 2013 / Brasil)
Direção: Hilton Lacerda
Roteiro: Hilton Lacerda
Com: Irandhir Santos, Jesuita Barbosa, Rodrigo García, Sylvia Prado, Sílvio Restiffe
Duração: 110 min.
A trama se passa em Recife durante o período da ditadura militar. O foco, um amor proibido entre o artista Clécio e o soldado Arlindo, mais conhecido como Fininha por causa de sua voz. Uma relação homossexual, entre um transgressor libertário e um militar opressor em um mundo de ideias. E o mais interessante de Tatuagem é nos contar essa história sem exageros panfletários.
O início do filme é construído em paralelo, nos mostrando a rotina dos dois. Clécio é o líder do grupo teatral Chão de Estrelas, com seus espetáculos transgressores que tem em Paulete a maior estrela. O transformista é também um caso de Clécio, e tem uma personalidade forte, que sempre busca provocar o que está ao seu redor. O estilo hippie do grupo, sempre em um clima transgressor, tendo um militar no meio, nos remete ao clima da peça / filme Hair, apesar de terem outras questões envolvidas.
A construção inicial de Fininha é bastante simbólica e diferente do personagem Bukowski da referida história americana. A cena inicial é ele sentado em sua cama no quartel e as grades das demais camas na perspectiva que a câmera nos mostra, se assemelha a grades de uma prisão. Há sempre esse clima quando vemos o exército, algo que nos remete aos versos de Vandré "no quartel lhes ensinam antiga lição, de morrer pela pátria e viver sem razão".
E é curioso que Hilton Lacerda queria nos mostrar esse Fininha assim, preso em um mundo sem sentido, mas ao mesmo tempo não fazê-lo ingênuo. Ainda que a belíssima cena de Clécio cantando no palco "Esse Cara" nos remeta a um jogo de sedução ao menino que ali está, tudo é muito mais profundo, a começar pela letra da música. Não há na relação uma divisão clara de papéis, de sedutor e seduzido, de dominador e dominado. Eles estão o tempo todo se misturando e invertendo papéis. Principalmente, quando Fininha começa a questionar a própria filosofia de Clécio ao dizer que ele não pode ter ciúmes, nem posses.
Toda a construção da relação do casal, e das relações humanas em geral que são expostas no filme é feita de uma maneira bastante sensível. Não há julgamentos nem em relação às pessoas que estão no quartel. Todos são vistos como seres humanos, todos frágeis e capazes de serem fortes. Parece que Hilton Lacerda não quer polemizar ou mesmo aprofundar temas, apenas contar uma experiência de vida de uma forma leve. Mesmo a repressão militar do período ditatorial é citado superficialmente.
E nada disso é ruim, é uma escolha. Não cabe a Tatuagem ser intenso seja emocionalmente, ou em denúncia. Quer apenas nos passar uma sensação do momento, da própria busca pela liberdade e pela força de transgredir os limites através da arte. Talvez por isso, as imagens em Super-8 casem tão bem na mistura fotográfica da obra. Elas, por si só, nos remetem a uma nostalgia de um tempo que não volta. Vivenciamos melhor o clima do Chão de Estrelas e sua eterna festa.
E o maestro de tudo isso é Clécio, ou melhor, o ator Irandhir Santos que nos passa toda a verdade de seu personagem e sua necessidade de reconstruir-se a partir da arte. Um ator que demonstra, cada vez mais, talento para brincar em nos passar sua verdade e a verdade do personagem, sem se repetir. É interessante perceber, por exemplo, o que tem de semelhante e diferente entre Clécio e Zizo. Dois artistas de Recife, que chamam a atenção através da transgressão, onde o sexo também é uma busca natural diante do tabu imposto pela sociedade. Mas, ao mesmo tempo, duas pessoas completamente diferentes, não apenas no exterior óbvio, mas na alma. Clécio não tem a angústia de Zizo, ainda que sua alma se inquiete diante da realidade à sua volta. E Irandhir sabe nos passar muito bem essas diferenças.
Tatuagem é um filme poético e belo. Uma fábula delicada sobre o amor, a liberdade e os direitos de cada um que apesar de se situar em um período específico de nossa história, se torna universal e atemporal. Recife nos brinda a cada dia com um cinema que realmente empolga.
Tatuagem (Tatuagem, 2013 / Brasil)
Direção: Hilton Lacerda
Roteiro: Hilton Lacerda
Com: Irandhir Santos, Jesuita Barbosa, Rodrigo García, Sylvia Prado, Sílvio Restiffe
Duração: 110 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Tatuagem
2013-11-24T08:00:00-03:00
Amanda Aouad
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