
Trago hoje não exatamente uma cena, mas uma sequência. A sequência de transformação da personagem Vivian Ward, interpretada por Julia Roberts em Uma Linda Mulher. Porque assim como a sequência de passagem de tempo de Um lugar Chamado Notting Hill através das estações do ano enquanto o personagem de Hugh Grant caminha, ela tem uma economia narrativa muito boa, pautada pela música de Roy Orbison.
Uma Linda Mulher, o filme, nada mais é do que mais uma adaptação do conto de Cinderela. A mocinha pobre que encontra e se apaixona pelo príncipe encantado que lhe dá outra chance na vida. Em tempos de empoderamento feminino, não é uma boa premissa, mas há nele também toda a construção do ideal romântico.

Essa sequência em específico é quando Vivian ganha um banho de loja com roupas, cabelo e maquiagem que a transformam em uma "verdadeira" dama, digna de acompanhar Edward Lewis, o empresário vivido por Richard Gere, em reuniões sociais. A música começa e a sequência vai sendo montada em seu ritmo. Tendo inclusive Julia Roberts dançando em alguns momentos.

A música para um pouco para uma cena com som direto, onde Vivian elogia a gravata de um vendedor dizendo que Edward adoraria ela. O gerente manda o vendedor tirar a gravata e entregar a ela. Detalhe que este plano é construído com câmera alta, vendo os três de cima para baixo. É um momento de rebaixamento dela, que deixa de ser o foco de admiração, tanto que a música não está em primeiro plano, para lembrar a presença dele, ainda forte. Tudo só está acontecendo por causa de Edward.

Vem então, uma cena que é uma espécie de vingança. Vivian passa pela loja que não a quis receber no dia anterior. As vendedoras correm para atendê-la e ela se dirige a que a expulsou perguntando se lembra dela. Quando a moça não a reconhece e ela a lembra, diz ainda "você ganha por comissão, né? Que grande erro". Mostrando as compras feitas por ela. A câmera na mão acompanha Vivian em sua movimentação pela loja.


No final, ainda tem ela no quarto do hotel, entregando uma gorjeta ao funcionário (e não mais o chiclete do primeiro dia). Ou seja, uma perfeita dama, domada, quase adestrada pela etiqueta social. É verdade. Mas, também há o referencial romântico do tudo por amor e da possibilidade dos contos de fadas.