
Depois de contar a formação histórica em
Conterrâneos Velhos de Guerra e política
Barra 68 – Sem Perder a Ternura da cidade de Brasília,
Vladimir Carvalho chega enfim a sua formação cultural com
Rock Brasília - Era de Ouro. O documentário se utiliza da formação das bandas
Legião Urbana,
Capital Inicial e
Plebe Rude para falar de uma forma didática, mas bem realizada, do movimento que surgiu naquela cidade na
década de oitenta.
Documentarista tradicional, figura importante do movimento
Cinema Novo,
Vladimir Carvalho sabe conduzir bem uma história. Não há dúvidas. Entre depoimentos dos integrantes das três bandas, produtores que participaram do processo e os pais dos garotos, ele consegue nos conduzir em uma viagem histórica instigante, que mostra um pouco da essência daquele
movimento que transformou o cenário
musical do país. É ótimo ver, por exemplo, que ele não recorre a especialistas desnecessários, deixando o tom íntimo, quase de confissão daqueles que de fato vivenciaram aquela trama. Há apenas a inserção dos
Paralamas, que foi fundamental para o início dos grupos e de
Caetano Veloso em uma citação à participação do
Legião Urbana no programa
Chico e Caetano, que marca um divisor de águas entre a antiga e nova geração da
música brasileira.

No mais, temos muitas imagens de arquivos e uma lamentável inserção de simulação de cenas, como a do encontro no lago, através da carta de
Dinho Ouro Preto. Ainda bem que esses momentos são poucos. O que prevalece mesmo são os depoimentos e imagens de arquivo que reconstróem a época de uma forma envolvente. Faltou mais
música, já que era o forte daquele grupo. E talvez uma linguagem mais arriscada, condizente com a atitude do
rock pós-punk da turma. O didatismo e padrão do documentário
Rock Brasília, no entanto, ajuda na comunicação com todos os públicos, mesmo aqueles que não vivenciaram o momento, nem compreendem o que significa a
geração Coca-Cola.
É interessante ver os depoimentos dos pais dos integrantes dos três grupos para entender o cenário em que eles foram criados e como surge o
gosto musical de cada um. É uma forma também de conhecer o
movimento pelos bastidores do mostrado na imprensa, nos deixando mais próximos de cada um e compreendendo tudo que arriscaram para seguir seus sonhos. É natural que
Renato Russo ganhe destaque, já que o líder do
Legião Urbana é apontado por todos como o líder do movimento em si. Foi ele quem criou o
Aborto Elétrico junto a André Pretorius e Fê Lemos. A aura de gênio já lhe seguia desde aquele tempo. Mas, Carvalho consegue dividir bem sua construção entre os três grupos, mostrando as fases de cada um e os momentos importantes no cenário nacional e local.

É interessante vermos, por exemplo,
Dinho Ouro Preto falando do
Programa do Chacrinha e as exigências por baixo do pano de tocar em
Bailes Play Back como contrapartida da presença do grupo no programa. Por mais que na época ele tenha denunciado isso no jornal, gerando maior repercussão para o
Capital Inicial, a revelação aqui em detalhes, nos deixa ainda mais intrigados. Como é bom também ver Philippe Seabra refazendo o percurso do primeiro show da
Plebe Rude fora de
Brasília e acompanhar sua crítica a atual concessão que as bandas precisam fazer como quando ele critica os
Titãs em Ana Maria Braga. Assim como acompanhamos com interesse Fernando e Flávio Lemos, Marcelo Bonfá e Dado Villa Lobos em suas visões de cada acontecimento.

Mesmo falecido,
Renato Russo está presente em duas entrevistas. Não deixa de ser pontos altos do documentário. A primeira, inédita feita em 1988 pelo diretor do filme, mostra
Renato Russo à vontade ao falar do nascimento do
rock de sua geração. A segunda, feita pela MTV e já divulgada amplamente, mostra o canto em um quarto de hotel, em 1994, onde fala de tudo sem receios sobre tudo de bom e ruim que passou até ali em sua carreira. Provavelmente um dos seus últimos momentos totalmente à vontade, já que morreria dois anos depois das complicações da AIDS, e principalmente, como ressaltou sua irmã, de depressão. Quem houve o último
disco da banda, Tempestade, percebe bem o processo depressivo em que ele se jogou.
Por fim,
Vladimir Carvalho nos presenteia com um encerramento emocionante que resume bem o espírito daqueles grupos e o que eles conseguiram. Só adianto que tem como protagonista o pai de Fê e Flávio Lemos, o professor Briquet de Lemos. É forte, ao ponto de nos deixar sentados na cadeira até o final dos créditos ao som de
Tempo Perdido.
Rock Brasília - Era de Ouro (Rock Brasília - Era de Ouro: 2011 / Brasil)
Direção: Vladimir Carvalho
Com: Renato Russo, Dinho Ouro Preto, Philippe Seabra, Fernando Lemos.
Duração: 80 min.