Albert Nobbs
O mais satisfeito dos seres sempre quer algo. É intrínseco ao ser humano o desejo, afinal, aquele que não quer mais nada da vida, não precisa mais dela, melhor ir embora, porque a vida é essa eterna busca. E a gente sempre se identifica nos filmes pelo algo que o protagonista está desejando. É emocionante, então, ver uma história onde tudo que o personagem quer é a possibilidade de ser ele mesmo.
Albert Nobbs é um mordomo exemplar de uma pequena pousada na Irlanda do século XIX. Todos o respeitam e admiram sua rigidez e presteza. O que ninguém sabe é que Nobbs esconde um grande segredo: é, na verdade, uma mulher. Circunstâncias dolorosas a levaram a se disfarçar de homem por trinta anos e viver nessa rotina mecânica de juntar dinheiro para realizar um sonho. Albert Nobbs não vê a hora de chegar o dia em que será dona de uma tabacaria, onde poderá morar nos fundos da loja e ser ela mesma. Mas, até lá, terá muita bandeja para servir.
A força de situação que nos é apresentada é defendida com grande talento por Glenn Close. A atriz incorpora Nobbs com grande emoção, tudo é dito em seu olhar. As expressões de tensão, medo, conformismo e até mesmo ingenuidade são demonstrados a cada cena, nos envolvendo com o personagem e nos fazendo torcer por seu final feliz. Porém, o clima do filme nos deixa a todo instante em alerta, como um pressentimento de que aquilo não poderá terminar bem. Tudo é uma ameaça. O novato que divide o quarto por uma noite, a dona da pousada sempre atenta, os colegas de trabalho, o rapaz que surge para limpar a lareira e logo percebe que Nobbs guarda dinheiro, a garota que ele elege para ser sua esposa, o médico sempre presente.
A sensação de algo ruim prestes a acontecer é forte e a trajetória não menos triste. Albert Nobbs é mesmo um personagem fadado à dor. O momento em que ele explica o porquê de se disfarçar de homem é um dos mais comoventes da trama. É um clima sempre pesado, uma sensação de não pertencimento, uma dor por não poder seguir seus instintos, um desespero de ser descoberto. Quando Nobbs conhece Mr. Page e sua história a esperança se acende como a de uma menina que acaba de descobrir que pode crescer e realizar seus sonhos. É uma chama que ilumina o personagem, mas o torna também ingênuo, sem perceber que a vida não é assim tão fácil.
A amizade entre Nobbs e Page, vivido por Janet McTeer, se torna, então, um ponto curioso. Como um divisor de águas, mas ao mesmo tempo um caminho delicado. E as duas atrizes conseguem construir muito bem essa afinidade e consequências possíveis. Não por acaso, ambas foram indicadas nas principais premiações do ano. A cena da praia, por exemplo, é outro grande momento do filme. Uma espécie de emoção, libertação e ao mesmo tempo estranhamento daqueles corpos que não sabem mais qual a verdadeira identidade. E Rodrigo García sabe explorar bem esse crescente de emoções, com sua câmera a observar de longe, sem invadir os personagens, mas ao mesmo tempo se tornando próxima a eles.
É assim que García nos conduz pela rotina daquela pousada. Seja na cozinha, na arrumação dos quartos, no sino a tocar ou na intimidade de Nobbs contando seus trocados embaixo da tábua do quarto. Ele nos deixa próximos dos dilemas dos personagens, sem precisar explicar muito, apenas mostrando detalhes de movimentações de cena, como na festa à fantasia, por exemplo, quando Albert Nobbs fica parado como uma estátua em um canto da sala observando a movimentação dos demais empregados, principalmente do rapaz Joe Mackenzie, vivido por Aaron Johnson, que tenta se divertir junto aos hóspedes, ou a bela Helen Dawes, muito bem interpretada por Mia Wasikowska, seu objeto de desejo.
Albert Nobbs é um retrato de um ser sofrido que não vive, ele apenas sobrevive dia após dia na esperança de conseguir realizar seu sonho. Mais do que uma tabacaria, Nobbs quer a liberdade de ser ele mesmo, seja como homem ou como mulher. Simplesmente se sentir seguro, sem depender da aprovação de mais ninguém. E até por isso, tem uma trajetória triste, fadada a não dar certo, nos envolvendo em seu drama e nos deixando pensativos. Um filme forte, ainda que não seja esplêndido.
Albert Nobbs (Albert Nobbs: 2012 / Irlanda, Reino Unido)
Direção: Rodrigo García
Roteiro: John Banville e Glenn Close,
Com: Glenn Close, Janet McTeer, Jonathan Rhys Meyers, Mia Wasikowska, Aaron Johnson.
Duração: 113 min.
Albert Nobbs é um mordomo exemplar de uma pequena pousada na Irlanda do século XIX. Todos o respeitam e admiram sua rigidez e presteza. O que ninguém sabe é que Nobbs esconde um grande segredo: é, na verdade, uma mulher. Circunstâncias dolorosas a levaram a se disfarçar de homem por trinta anos e viver nessa rotina mecânica de juntar dinheiro para realizar um sonho. Albert Nobbs não vê a hora de chegar o dia em que será dona de uma tabacaria, onde poderá morar nos fundos da loja e ser ela mesma. Mas, até lá, terá muita bandeja para servir.
A força de situação que nos é apresentada é defendida com grande talento por Glenn Close. A atriz incorpora Nobbs com grande emoção, tudo é dito em seu olhar. As expressões de tensão, medo, conformismo e até mesmo ingenuidade são demonstrados a cada cena, nos envolvendo com o personagem e nos fazendo torcer por seu final feliz. Porém, o clima do filme nos deixa a todo instante em alerta, como um pressentimento de que aquilo não poderá terminar bem. Tudo é uma ameaça. O novato que divide o quarto por uma noite, a dona da pousada sempre atenta, os colegas de trabalho, o rapaz que surge para limpar a lareira e logo percebe que Nobbs guarda dinheiro, a garota que ele elege para ser sua esposa, o médico sempre presente.
A sensação de algo ruim prestes a acontecer é forte e a trajetória não menos triste. Albert Nobbs é mesmo um personagem fadado à dor. O momento em que ele explica o porquê de se disfarçar de homem é um dos mais comoventes da trama. É um clima sempre pesado, uma sensação de não pertencimento, uma dor por não poder seguir seus instintos, um desespero de ser descoberto. Quando Nobbs conhece Mr. Page e sua história a esperança se acende como a de uma menina que acaba de descobrir que pode crescer e realizar seus sonhos. É uma chama que ilumina o personagem, mas o torna também ingênuo, sem perceber que a vida não é assim tão fácil.
A amizade entre Nobbs e Page, vivido por Janet McTeer, se torna, então, um ponto curioso. Como um divisor de águas, mas ao mesmo tempo um caminho delicado. E as duas atrizes conseguem construir muito bem essa afinidade e consequências possíveis. Não por acaso, ambas foram indicadas nas principais premiações do ano. A cena da praia, por exemplo, é outro grande momento do filme. Uma espécie de emoção, libertação e ao mesmo tempo estranhamento daqueles corpos que não sabem mais qual a verdadeira identidade. E Rodrigo García sabe explorar bem esse crescente de emoções, com sua câmera a observar de longe, sem invadir os personagens, mas ao mesmo tempo se tornando próxima a eles.
É assim que García nos conduz pela rotina daquela pousada. Seja na cozinha, na arrumação dos quartos, no sino a tocar ou na intimidade de Nobbs contando seus trocados embaixo da tábua do quarto. Ele nos deixa próximos dos dilemas dos personagens, sem precisar explicar muito, apenas mostrando detalhes de movimentações de cena, como na festa à fantasia, por exemplo, quando Albert Nobbs fica parado como uma estátua em um canto da sala observando a movimentação dos demais empregados, principalmente do rapaz Joe Mackenzie, vivido por Aaron Johnson, que tenta se divertir junto aos hóspedes, ou a bela Helen Dawes, muito bem interpretada por Mia Wasikowska, seu objeto de desejo.
Albert Nobbs é um retrato de um ser sofrido que não vive, ele apenas sobrevive dia após dia na esperança de conseguir realizar seu sonho. Mais do que uma tabacaria, Nobbs quer a liberdade de ser ele mesmo, seja como homem ou como mulher. Simplesmente se sentir seguro, sem depender da aprovação de mais ninguém. E até por isso, tem uma trajetória triste, fadada a não dar certo, nos envolvendo em seu drama e nos deixando pensativos. Um filme forte, ainda que não seja esplêndido.
Albert Nobbs (Albert Nobbs: 2012 / Irlanda, Reino Unido)
Direção: Rodrigo García
Roteiro: John Banville e Glenn Close,
Com: Glenn Close, Janet McTeer, Jonathan Rhys Meyers, Mia Wasikowska, Aaron Johnson.
Duração: 113 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Albert Nobbs
2012-02-23T08:13:00-02:00
Amanda Aouad
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