
Era um sonho acalentado por muitos, um projeto
grandioso, com tantas estrelas envolvidas que pode ter como quase figurante de luxo uma vencedora do Oscar. Com uma ação de marketing proporcional aos poderes de seus personagens e ao perigo que irão enfrentar.
Os Vingadores, filme dos estúdios
Marvel que reúne boa parte dos heróis criados por
Jack Kirby e
Stan Lee felizmente não é um amontoado de heróis unidos à marra apenas para ganhar dinheiro. É um dos melhores
filmes de super-heróis já feito.
A ideia é bem simples e complexa ao mesmo tempo,
Loki se une a uma raça alienígena, os
Chitauri, para roubar da
S.H.I.E.L.D. o cubo cósmico conhecido como
Tesseract e assim dominar a Terra. Vendo a gravidade da situação,
Nick Fury, o líder da companhia, vê que é o momento de colocar em prática um sonho antigo, unir pessoas com poderes especiais como uma espécie de time capaz de neutralizar
Loki e reaver o
Tesseract. O problema é que cada uma dessas pessoas tem seu método próprio de trabalho, nunca tendo estado juntas antes. E as brigas de
ego podem fazer tudo se perder.

Muitos pensaram que tantas estrelas juntas gerariam problemas de brigas de egos e tornaria o
filme algo impossível. O mais interessante de
Os Vingadores é que esse provável problema é tratado no roteiro como uma espécie de metáfora da vida real. Os personagens que cada uma das estrelas do elenco interpreta, são estrelas próprias da nona arte, os
quadrinhos, e estão todos disputando mais espaço na história, cada um com sua personalidade. A grande sacada do roteiro é tratar esse dilema, que poderia ser trágico, com humor. Os diálogos são ágeis, ferinos e com diversas referências incríveis como o
Capitão América dizer: "Desculpe atrapalhar o Shakespeare no parque", ao falar com
Thor. Ou o
Homem de Ferro criticar o próprio
Capitão por se vestir de "bandeira". Ou ainda o próprio
Dr. Bruce Banner fingindo perder o controle para a
Viúva Negra. E nisso, estou me referindo apenas à apresentação dos personagens para não entregar momentos melhores como algumas cenas de
Hulk em plena batalha.

A construção da curva dramática da história é muito bem pensada. Temos um início tenso, com a apresentação do conflito principal:
Loki, sua aliança com os
alienígenas e o roubo do
Tesseract, que culmina também com a "conversão" do
Gavião Arqueiro e do cientista
Dr. Erik Selvig para o seu lado. Após essa abertura, temos uma apresentação dos personagens. Interessante perceber que cada herói tem uma pequena apresentação, com suas principais características para não ficar um
filme apenas para iniciados, seja pelos outros
filmes ou pelos
quadrinhos. A reunião inicial, cheia de farpas e brigas que culmina na óbvia derrota, a reunião de forças e a revanche. Afinal, o nome
Os Vingadores já diz tudo. Eles não conseguiram defender a Terra, então, irão vingá-la.

Apesar do prólogo tenso, assim que os personagens começam a ser apresentados, o
humor surge com força total, assumindo o tom do roteiro. Isso deixa o ritmo do
filme dinâmico, leve, envolvente, onde o entretenimento toma conta da tela, mas com pequenas doses de camadas mais complexas da história. Os
quadrinhos sempre buscaram traduzir e compreender o seu próprio tempo, mesmo através de metáforas de
heróis imaginários. Logo é natural vermos as discussões do Conselho Mundial, as referências do
Capitão a Hitler, as desconfianças do
Homem de Ferro em relação a verdadeira intenção da
S.H.I.E.L.D., o jogo de poder entre
Thor e
Loki, e as pinceladas do passado da
Viúva Negra, uma espiã russa, que tem muita mancha em seu currículo. O único problema do roteiro focado no
humor é deixar passar despercebido algumas dessas coisas. Além de não funcionar no momento em que era exigido uma atenção maior da platéia em relação ao drama que eles estariam passando. É como se nada fosse levado a sério.

E dentro desse jogo, os atores estelares funcionam perfeitamente. Vestindo o uniforme de seus
heróis, cada um deles se envolve como um próprio ego inflado que é ferido e precisa se reconstruir.
Robert Downey Jr. é uma encarnação perfeita de
Tony Stark, inteligente, egocêntrico e rápido nas atitudes, mantendo o ótimo trabalho dos
filmes solo do
Homem de Ferro.
Mark Ruffalo consegue encarnar o melhor
Bruce /
Hulk já feito, exatamente por interpretar ambos os papéis, ao contrário dos atores anteriores que faziam apenas
Bruce ou
Hulk. Interessante também como esse personagem é uma clara evolução do filme de Ang Lee e o de Louis Leterrier, interpretado por Edward Norton.
Chris Evans dá o tom canastrão exato que é necessário para o
Capitão América, que apesar da timidez e deslocamento inicial, dá demonstrações do verdadeiro líder que é do grupo. Assim como
Thor, consegue ser defendido por
Chris Hemsworth com a empáfia que um
deus precisa.
Scarlett Johansson também nos convence de sua
Viúva Negra, exímia espiã, que arranca o que quer dos interrogados. Assim como
Jeremy Renner nos dá bons motivos para acreditar nas motivações do
Gavião Arqueiro.

Quanto aos efeitos especiais, é chover no molhado elogiar qualquer um deles. O
filme está repleto de cenas impactantes como a que
Tony Stark veste a armadura no ar ou a cena em que
Hulk luta com um alienígena gigante. Até mesmo o 3D convertido funciona em várias cenas, construindo alguns efeitos interessantes como quando nos faz mergulhar em terrenos inóspitos. Ou em momentos de tensão, como na cabana onde Dr. Bruce se esconde, com diversas camadas de profundidade do local. Aliás, a direção de
Joss Whedon é bastante feliz na construção e utilização dessas imagens, efeitos e cenários, nos dando boas sensações e pistas.

Destaque para a discussão dos personagens sobre as armas que estão sendo produzidas pela
S.H.I.E.L.D., cujos enquadramentos vão ajudando a contar o ocorrido. Primeiro, um plano geral, tendo
Thor isolado do resto do grupo, depois com planos fechados que vão escondendo um certo detalhe na sala que só é revelado na fala final, além da câmera de ponta-cabeça que vai dando a noção da perda do controle daquelas pessoas. A trilha sonora também tem seus pontos altos, apesar de não ter nenhuma música própria característica. Destaque também para a cena em que
Loki ataca um teatro na Alemanha, onde os golpes seguem o ritmo da música apresentada pela orquestra local.
Ainda que não seja uma reinvenção da linguagem, tal qual Nolan fez com Batman,
Os Vingadores cumpre a sua função com louvor. Consegue reunir o maior número de
heróis, e consequentemente de estrelas, em uma mesma história, divertindo em suas cenas de
ação e tom bem humorado, além de passar o clima dos
quadrinhos e do porquê existe um grupo que precisa vingar o nosso planeta. Palmas para tamanho projeto.
Ah, claro, não podia faltar uma cena pós-créditos para nos deixar com gostinho de quero mais. E dessa vez, nem é preciso esperar os créditos inteiros, apenas a primeira parte.
Os Vingadores (The Avengers, 2012 / EUA)
Direção: Joss Whedon
Roteiro: Joss Whedon e Zak Penn
Com: Robert Downey Jr., Mark Ruffalo, Chris Evans, Chris Hemsworth, Scarlett Johansson, Jeremy Renner, Tom Hiddleston, Clark Gregg, Samuel L. Jackson e Gwyneth Paltrow
Duração: 142 min.