Kramer vs Kramer
Não por acaso os três atores principais do filme Kramer vs Kramer foram indicados ao Oscar. Ted Kramer, Joanna Kramer e Billy Kramer, interpretados respectivamente por Dustin Hoffman, Meryl Streep e Justin Henry, até hoje a criança mais jovem a ter uma indicação, passam por tensões emocionais que são propícias a grandes interpretações e fazem desse filme algo tão especial.
A história poderia ser tola ou absurda. Uma mulher cansa de ser ignorada pelo marido e resolve abandoná-lo de um dia para o outro. Um caso como tantos por aí. Mas o que chama a atenção é que ela não apenas abandona o marido, mas também o filho do casal de apenas sete anos. Assim, pai e filho têm que reaprender a viver. Convivendo com as dificuldades que é cuidar de uma criança e trabalhar ao mesmo tempo, Ted vai fazendo o melhor que pode, mas nada parece mesmo fácil. E quando tudo começava a se ajeitar, Joanna volta querendo brigar pela guarda do pequeno Billy.
Esta questão levantada de maneira leve em Kramer vs Kramer é mesmo para se pensar. Parece unanimidade a ideia de que a maternidade está sempre acima da paternidade. Não apenas pelo vínculo do cordão umbilical, pelo período de gestação, amamentação e primeiros reconhecimentos. Mas, mãe é sempre mãe. A mulher parece moldada para a maternidade, enquanto que o homem é o provedor externo. Parece natural que em toda separação o filho fique com a mãe e não com o pai.
A questão é que ao escolher abandonar Billy saindo de casa sem dar muitas satisfações, Joanna perde em nossa visão de espectador boa parte desse direito, ainda que o pequeno sofra tanto com a sua ausência. A cena em que Ted lê a carta da mãe para o filho, quase um mês depois dela ir embora é um símbolo disso. O garoto ainda chora e espera pela volta dela, mas quando as palavras começam a demonstrar que ela não pretende retornar, pelo menos não tão cedo, ele começa a mudar a expressão até que aumenta o volume da televisão não querendo mais ouvir.
O fato é que entre erros e acertos, Ted vai se tornando o melhor pai possível. Antes impaciente, ele começa a ficar dividido, participando mais da vida do garoto. Eles conversam, o pai conta histórias para dormir, passeiam no parque. Tornam-se amigos de fato. Em sua ligação tudo parece começar a se ajeitar, mesmo quando o pequeno sofre um acidente sério ao cair de um brinquedo. O desespero de Ted correndo pelas ruas e tentando ficar com ele durante o procedimento médico é comovente.
A evolução de Ted é visível em um detalhe da relação dos dois que Robert Benton, de maneira primorosa, coloca no início e no final do filme como um fechamento de ciclo. Pai e filho na cozinha fazendo rabanada. Na primeira tentativa tudo é estranho, estabanado e dá errado. No final parece harmonicamente ensaiado. Cada gesto, cada ingrediente, cada utensílio utilizado parece agora encaixado. Uma forma simbólica de demonstra o quanto eles se entenderam, o quanto estão juntos, ainda que tenham problemas a serem resolvidos, como a guarda do garoto.
O retorno de Joanna, ainda que esperado, é incômodo. O desespero de Ted, as complicações que se formam, a luta no tribunal. Tudo eleva a emoção e nossa torcida. As cenas dos depoimentos dos dois são o ponto alto da disputa. Não apenas pela excelente interpretação de Dustin Hoffman e Meryl Streep, como pelo texto, pela forma como os dois advogados vão acuando os interrogados em seus pontos fracos. E é impressionante o quanto seguimos torcendo por Ted, mesmo com todo o apelo de uma mãe lutando por seu filho.
Kramer vs Kramer é um jogo de emoções, uma construção bela de atuações e redefinições de valores familiares. Nos envolvemos com aquela família, sofremos junto com Ted, nos apaixonamos pelo pequeno Billy, tentamos entender o lado de Joanna. Queremos que tudo se resolva da melhor maneira, apesar de uma sensação constante de injustiça. E no final, seguimos o fluxo, sofrendo, nos emocionando e vibrando com cada reviravolta. Fica um certo apaziguamento de que afinal, assim é a vida.
Kramer vs Kramer (Kramer vs Kramer, 1979 / EUA)
Direção: Robert Benton
Roteiro: Robert Benton
Com: Dustin Hoffman, Meryl Streep, Justin Henry e Jane Alexander
Duração: 105 min.
A história poderia ser tola ou absurda. Uma mulher cansa de ser ignorada pelo marido e resolve abandoná-lo de um dia para o outro. Um caso como tantos por aí. Mas o que chama a atenção é que ela não apenas abandona o marido, mas também o filho do casal de apenas sete anos. Assim, pai e filho têm que reaprender a viver. Convivendo com as dificuldades que é cuidar de uma criança e trabalhar ao mesmo tempo, Ted vai fazendo o melhor que pode, mas nada parece mesmo fácil. E quando tudo começava a se ajeitar, Joanna volta querendo brigar pela guarda do pequeno Billy.
Esta questão levantada de maneira leve em Kramer vs Kramer é mesmo para se pensar. Parece unanimidade a ideia de que a maternidade está sempre acima da paternidade. Não apenas pelo vínculo do cordão umbilical, pelo período de gestação, amamentação e primeiros reconhecimentos. Mas, mãe é sempre mãe. A mulher parece moldada para a maternidade, enquanto que o homem é o provedor externo. Parece natural que em toda separação o filho fique com a mãe e não com o pai.
A questão é que ao escolher abandonar Billy saindo de casa sem dar muitas satisfações, Joanna perde em nossa visão de espectador boa parte desse direito, ainda que o pequeno sofra tanto com a sua ausência. A cena em que Ted lê a carta da mãe para o filho, quase um mês depois dela ir embora é um símbolo disso. O garoto ainda chora e espera pela volta dela, mas quando as palavras começam a demonstrar que ela não pretende retornar, pelo menos não tão cedo, ele começa a mudar a expressão até que aumenta o volume da televisão não querendo mais ouvir.
O fato é que entre erros e acertos, Ted vai se tornando o melhor pai possível. Antes impaciente, ele começa a ficar dividido, participando mais da vida do garoto. Eles conversam, o pai conta histórias para dormir, passeiam no parque. Tornam-se amigos de fato. Em sua ligação tudo parece começar a se ajeitar, mesmo quando o pequeno sofre um acidente sério ao cair de um brinquedo. O desespero de Ted correndo pelas ruas e tentando ficar com ele durante o procedimento médico é comovente.
A evolução de Ted é visível em um detalhe da relação dos dois que Robert Benton, de maneira primorosa, coloca no início e no final do filme como um fechamento de ciclo. Pai e filho na cozinha fazendo rabanada. Na primeira tentativa tudo é estranho, estabanado e dá errado. No final parece harmonicamente ensaiado. Cada gesto, cada ingrediente, cada utensílio utilizado parece agora encaixado. Uma forma simbólica de demonstra o quanto eles se entenderam, o quanto estão juntos, ainda que tenham problemas a serem resolvidos, como a guarda do garoto.
O retorno de Joanna, ainda que esperado, é incômodo. O desespero de Ted, as complicações que se formam, a luta no tribunal. Tudo eleva a emoção e nossa torcida. As cenas dos depoimentos dos dois são o ponto alto da disputa. Não apenas pela excelente interpretação de Dustin Hoffman e Meryl Streep, como pelo texto, pela forma como os dois advogados vão acuando os interrogados em seus pontos fracos. E é impressionante o quanto seguimos torcendo por Ted, mesmo com todo o apelo de uma mãe lutando por seu filho.
Kramer vs Kramer é um jogo de emoções, uma construção bela de atuações e redefinições de valores familiares. Nos envolvemos com aquela família, sofremos junto com Ted, nos apaixonamos pelo pequeno Billy, tentamos entender o lado de Joanna. Queremos que tudo se resolva da melhor maneira, apesar de uma sensação constante de injustiça. E no final, seguimos o fluxo, sofrendo, nos emocionando e vibrando com cada reviravolta. Fica um certo apaziguamento de que afinal, assim é a vida.
Kramer vs Kramer (Kramer vs Kramer, 1979 / EUA)
Direção: Robert Benton
Roteiro: Robert Benton
Com: Dustin Hoffman, Meryl Streep, Justin Henry e Jane Alexander
Duração: 105 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Kramer vs Kramer
2013-01-16T08:30:00-03:00
Amanda Aouad
critica|drama|Dustin Hoffman|Meryl Streep|Robert Benton|
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