
A trama gira em torno de Adam Bell, o professor de história interpretado por Jake Gyllenhaal, que um dia, ao assistir um filme percebe um ator que é a sua cara. Atônito, ele começa a pesquisar sobre aquela pessoa e consegue descobrir seu nome e endereço. Mas, a medida que ele vai conhecendo melhor Anthony St. Claire e sua vida, ele vai perdendo cada vez mais a sua própria identidade.
Apesar de histórias completamente diferentes com suas particularidades, uma coisa parece sempre presente nas obras de Denis Villeneuve, o suspense. Seja em um drama intenso como Incêndios, uma estrutura mais clássica como Os Suspeitos ou os mistérios e tom meio surrealista que rondam O Homem Duplicado, há sempre algo a ser descoberto, uma expectativa crescente, um jogo com o espectador que funciona.

A começar pela identidade do seu protagonista. O que explica a duplicidade? Qual o significado disso na vida de ambos? São a mesma pessoa? Há algo de real ou tudo não passa de metáforas. Tal qual a cegueira branca de Ensaio Sobre a Cegueira do mesmo escritor, tudo ali parece um tratado sobre a própria perda e a busca da própria identidade diante de uma sociedade cada vez mais coletiva e invasiva. Não por acaso, é tão fácil encontrar Anthony e até se passar por ele. Prestem atenção também na mãe de Adam e algumas pistas que esta dá em suas conversas com o filho.
Há também a constante presença de aranhas permeando o filme. Aranhas que são as tecelãs do destino, construindo diversas mitologias e significados em religiões e povos antigos. É fato que aqui elas se associam às mulheres, estão sempre com elas, prestes a ser esmagada, substituindo sua cabeça, ou literalmente em seu lugar. Mas, nunca sendo uma ameaça real ou mesmo substituindo Adam ou seu duplo. A teia que tecem, então, está mais próxima dos medos e desejos do protagonista que algo concreto.

Da mesma forma que, ao citar para os alunos o pensamento de Hegel complementado por Marx de que tudo acontece duas vezes, primeiro como tragédia, depois como farsa, ele acaba fazendo uma previsão de sua própria vida em um encontro com seu duplo. O que se repete? O que é farsa e o que é tragédia? Tampouco saberemos assim, à primeira vista.Mas, as falas da mulher de Anthony vão dando as pistas do que é seja essa repetição, desde a primeira conversa quando ela desconfia do telefone, até a conversa na cama sobre como foi o dia do marido.
De qualquer maneira, O Homem Duplicado é daquelas experiências que empolgam por contar uma boa história, com uma direção precisa e criativa, envolvendo-nos nas questões de seus personagens e nos fazendo refletir sobre aquilo e sobre nós mesmos. Essa é a magia que o cinema pode nos proporcionar e o porquê dele encantar tanto.
O Homem Duplicado (Enemy, 2013 / EUA)
Direção: Denis Villeneuve
Roteiro: Javier Gullón
Com: Jake Gyllenhaal, Mélanie Laurent, Sarah Gadon, Isabella Rossellini
Duração: 90 min.