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Três anúncios para um crime
Três anúncios para um crime
Ebbing, Missouri. Uma mãe inconformada com a falta de solução do estupro e assassinato de sua filha coloca três placas de outdoor questionando a eficácia da polícia. Cobra, nominalmente, o xerife Bill Willoughby, um homem admirado pela maioria da população e que está morrendo de câncer. As opiniões se dividem e esse é apenas o começo de uma estranha e inusitada saga por justiça.
Homofobia, racismo, machismo, violência doméstica, abuso de poder policial e censura. Tem um pouco de tudo em Três anúncios para um crime. O problema é que essas questões são lançadas em cena sem um desenvolvimento adequado. Diz que o policial "gosta de bater em negros", por exemplo, mas não desenvolve a trama a ponto de discuti-la profundamente. Os próprios negros em cena são apenas escadas para a protagonista em sua dor e luta.
Ainda que tenha uma delegacia e seus policiais como um dos focos da trama, Ebbing parece uma cidade sem lei. Não é apenas o crime brutal contra a moça que fica sem solução. Um rapaz é atirado de uma janela e ninguém responde judicialmente por isso. Um incêndio criminoso acontece e parece que está tudo certo. Uma moça é presa quase em uma armação da polícia para se vingar de uma cidadã e parece normal. Por mais que o tom do politicamente incorreto seja a proposta da obra, há um exagero em corroborá-lo.
Um filme pode expor situações lamentáveis sem defendê-las. Em Sete Psicopatas e um Shih Tzu, por exemplo, Martin McDonagh já trazia essa proposta, mas deixava mais clara a sátira, sem glamourizar seus protagonistas. Mildred Hayes, a protagonista de Três anúncios para um crime, não é uma pessoa tão detestável assim, mas tem problemas éticos e morais que não são aprofundados em uma estrutura que faz de tudo para que a admiremos por sua força e coragem de buscar justiça. Afinal ela é uma mãe que teve a filha estuprada, assassinada e queimada, mas não se rende e desafia todos aqueles homens que, na sua cabeça, se recusam a investigar o crime.
Frances McDormand está excelente em sua atuação, isso ajuda a criar a empatia pela protagonista. Mas em nenhum momento o filme parece querer questioná-la. A própria idiotização do policial Dixon, também bem interpretado por Sam Rockwell, parece ser uma estratégia para fazer com que ela pareça melhor. Não por acaso o filme prefere deixar o embate entre os dois, já que o xerife Bill Willoughby, outra boa interpretação de Woody Harrelson, teria um embate mais complexo.
A direção de Martin McDonagh é precisa, ainda que não salte aos olhos tal qual atuação e trama. A maneira como as placas vão sendo reveladas, por exemplo, é bem construída. Tanto nas idas de traz pra frente, como no jogo entre o que a câmera revela e o que as personagens vêem, criando um suspense e ambientando a história. O próprio vermelho das placas ajuda a criar um efeito que impacta, principalmente quando elas são vistas em conjunto na estrada.
Há uma hierarquia visual também que ajuda a construir a sensação de poder e embate de cada disputa. E, muitas vezes, as próprias regras da linguagem se subvertem, como quando Willoughby interroga Mildred Hayes, ela sentada, ele em pé. A câmera baixa mostrando-o em uma situação superior a ela. Mas corta para um plano em que ele é visto de costas e uma questão acontece, colocando ela em situação de poder mesmo que vista de cima para baixo.
Três anúncios para um crime é um filme complexo. Traz estereótipos e preconceitos em uma estrutura que se não os defende, não os questiona completamente, mas é competente em sua proposta de retrato politicamente incorreto de uma sociedade em decadência. Entre elementos positivos e negativos, acaba empolgando pela empatia com sua protagonista, mas refletindo um pouco, vemos que é uma proposta que cai no vazio.
Três anúncios para um crime (Three Billboards Outside Ebbing, Missouri, 2018 / EUA)
Direção: Martin McDonagh
Roteiro: Martin McDonagh
Com: Frances McDormand, Woody Harrelson, Sam Rockwell, Peter Dinklage, Zeljko Ivanek, Clarke Peters, Amanda Warren
Duração: 115 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Três anúncios para um crime
2018-02-13T08:30:00-03:00
Amanda Aouad
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