O Senhor dos Anéis é um épico. Uma jornada de defesa da Terra Média de um mal iminente que cresce a cada instante com o possível retorno de Sauron. O mago decaído havia sido derrotado por Isildur 2.500 anos antes, mas graças ao seu anel do poder, uma parte de sua alma ficou vigiando em Mordor em um formato de olho. Após todo esse tempo adormecido, anel e mestre querem, mais do que tudo, se reunir novamente e dominar todas as raças. Mas, para sorte dos povos da Terra Média, esse anel está nas mãos daqueles seres menos prováveis, os pacatos hobbits do Condado.
É interessante como Tolkien criou uma história efetivamente em três capítulos, ou três atos, se formos observar a narrativa dramática. Mesmo que cada livro / filme, tenha seu ponto de partida, sua resolução e seu clímax, em uma visão macro, a jornada de destruição do anel tem o seu primeiro ato em A Sociedade do Anel, seu desenvolvimento em As Duas Torres e sua resolução em O Retorno do Rei. Tudo pensado harmoniosamente para que possa chegar em um desfecho satisfatório, que como todo épico não termina no clímax, estendendo o epílogo para que possamos nos despedir dos personagens a contento.
A Sociedade do Anel é, então, um filme introdução. Nele conhecemos a história do anel do poder, feito para a todos governar. Somos apresentados às diversas raças existentes na Terra Média. Ficamos conhecendo a missão principal: destruir o anel no fogo da montanha de Mordor onde ele foi fundido. O portador da missão que é o hobbit Frodo Baggins, e a sociedade que o protegerá nessa jornada.
Não por acaso, após a introdução necessária narrada por Galadriel, desembarcamos no Condado para conhecer a rotina dos pequenos heróis. Precisamos, acima de tudo, criar uma empatia por aqueles seres simpáticos que vão topar a missão de salvar o mundo. É poética a forma como Peter Jackson nos leva a ver o quão são pacatos, marcando inclusive o hobbit que fica varrendo a porta de sua toca e que será um rosto conhecido para o retorno no terceiro filme, como se estivéssemos em um fechamento de ciclo.
Temos também o primeiro contato com o anel e seu poder devastador. A forma como Bilbo não consegue se desfazer dele, o receio de Gandalf que não chega a tocá-lo em nenhum momento. A forma como Frodo se sente atraído mesmo sem saber o que é aquilo em seu chão. Aliás, a forma como o anel está sempre em destaque é interessante. Antes da formação da sociedade em Rivendell, por exemplo, há uma grande discussão entre os membros do conselho. Jackson leva a sua câmera para a mesa onde o anel está exposto. Ele fica em detalhe, com os reflexos das pessoas discutindo nele, e Frodo em segundo plano, sofrendo e sendo chamado.
Missão dada, fica a sensação estranha do quão rápido aquelas quatro criaturas pacatas que nunca colocaram os pés fora do Condado conseguem aceitar cruzar o mundo daquela maneira. Principalmente, Merry e Pippin que estavam ali roubando verduras e embarcam na "aventura". Frodo, pelo menos, sempre ouviu e adorou as histórias de aventuras do tio Bilbo e Sam é uma espécie de vassalo do "Sr. Frodo", sua fidelidade canina é admirável e compreensível. Além claro, de ser essencial para o sucesso da empreitada. De qualquer forma, é preciso ressaltar que tudo não acontece de uma maneira tão rápida no livro. A urgência de uma obra já com quase três horas de duração acabou tornando algumas questões atropeladas.
Por outro lado, Peter Jackson constrói toda a narrativa com um suspense interessante de jogo de imagens. Temos montagens em paralelo dos espectros do anel, por exemplo, procurando o Condado e os "Baggins", logo depois Frodo chega em casa e vê tudo revirado, mas era apenas Gandalf que tinha retornado da pesquisa. Ou quando estão em Bree e os espectros entram em um quarto e vemos os hobbits dormindo tranquilamente como se estivessem prestes a serem atacados. A tensão na floresta também é bem construída, assim como toda a sequência dentro das minas de Moria. Em compensação, a escolha da computação gráfica na parte de Galadriel prevendo o que aconteceria se ela pegasse o anel, é quase vergonhosa.
De qualquer forma, A Sociedade do Anel é um filme introdutório, mas que se completa em si. Claro, acaba sem nada resolvido, mas muitos destinos são traçados. Algumas mortes, separações, desenrolar de tramas são feitos. A primeira etapa da jornada foi completa. Outras complicações surgirão, mas outras questões avançaram a contento. Um filme que consegue introduzir uma história épica, trazer humor, romance, aventura, magia, suspense, e até tragédias que encantam públicos dos mais diversos. Um grande filme, e era apenas o começo.
Direção: Peter Jackson
Roteiro: Fran Walsh e Philippa Boyens
Com: Elijah Wood, Ian McKellen, Orlando Bloom, John Rhys-Davies, Sean Astin, Sean Bean, Cate Blanchett, Ian Holm, Andy Serkis, Viggo Mortensen, Liv Tyler e Hugo Weaving
Duração: 178 min.